O imortal da Academia Mato-Grossense de Letras, Carlos Gomes de Carvalho, criticou as ironias feitas com a forma de falar do cuiabano, especialmente com expressões populares e o sotaque característico da região. Durante entrevista ao PodOlhar, o escritor e pesquisador lamentou o que classificou como um comportamento recorrente em peças teatrais e em manifestações culturais que tratam a linguagem local como motivo de humor.
Autor do Dicionário de Termos e Expressões de Mato Grosso, Carvalho afirma que muitas das palavras e construções típicas do falar cuiabano têm origem no português clássico do século XVII e refletem heranças linguísticas de diferentes povos que passaram pela região. Segundo ele, o vocabulário tradicional ainda persiste em comunidades ribeirinhas, mais afastadas do centro urbano, onde a influência da linguagem original foi mais preservada.
“Há uma tendência muito grande de se ironizar, ou gozar a linguagem antiga do cuiabano. E isso passou, inclusive, para peças de teatro. Mas muitas dessas expressões são portuguesas clássicas, que você encontra nos mestres da língua, como Camões”, afirmou.
Para o acadêmico, a crítica ao modo de falar da população local revela uma visão limitada sobre a diversidade linguística do Brasil. Ele destaca que, ao longo do tempo, muitos cuiabanos passaram a sentir vergonha de seu sotaque e vocabulário, principalmente após experiências fora do estado, como ao estudar em grandes centros urbanos.
“Durante muitos anos, passou a ser vergonhoso falar como cuiabano. Muita gente que ia estudar no Rio de Janeiro voltava diferente, se envergonhava do próprio jeito de falar. Mas essas expressões são parte da nossa história”, disse.
Carvalho também chamou atenção para o valor dos neologismos populares. Para ele, essas criações linguísticas espontâneas, surgidas no cotidiano, carregam mais autenticidade do que os termos criados por estudiosos. Ele citou autores como Guimarães Rosa, no plano nacional, e Silva Freire, em Mato Grosso, como exemplos de escritores que conseguiram preservar e valorizar essa oralidade.
“O povo cria muito neologismo, e o neologismo do povo é mais autêntico. Por que não tratar com o mesmo respeito o sotaque dos que vieram do Sul, que também é forte? A riqueza linguística do popular é altamente aceitável”, concluiu.
O dicionário organizado por Carvalho reúne expressões típicas do estado, resgatando seu uso, origem e contexto histórico. A obra é fruto de pesquisa sobre a formação cultural e linguística de Mato Grosso, que mescla influências indígenas, africanas, luso-brasileiras e sul-americanas.
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