Imprimir

Notícias / Universo Jurídico

Lessa desmente juiz e diz que ele age a mando e por vingança

Da Redação - Alline Marques

O desembargador aposentado e secretário de Justiça e Direitos Humanos, Paulo Lessa, desmentiu as acusações feitas pelo juiz José Geraldo Palmeira e alega que as denúncias feitas pelo magistrado são apenas por vingança e ainda insinua que exista outra pessoa manipulando Palmeira. Ele questiona ainda o fato do juiz ter demorado tanto tempo para denunciá-lo.

Lessa destaca um processo ocorrido em 1995, quando Palmeira foi afastado da magistratura após ter sido denunciado de participar de um esquema de prostituição de detentas, além de conceder benefícios para presos, em sua maioria, condenados por tráfico de drogas. Com isso, Palmeira teria ganhado alguns “presentes” dos bandidos.

O voto de Lessa é bem enfático na condenação de Palmeira e por isso ele estaria tentando se vingar do desembargador. Em entrevista ao Olhar Direto, o secretário destacou ainda que também votou pelo afastamento do juiz em outro processo, no qual o desembargador Orlando Perri foi o relato.

“Ele tem raiva de mais há 14 ou 15 anos, por isso ele está fazendo isso. É um absurdo. Não tenho nada a ver com isso. Alguém está por trás disso tudo. Se isso fosse verdade porque não falou antes”, afirmou em entrevista ao Olhar Direto.

A denúncia, relatada pelo desembargador aposentado Flávio Bertin, relata que detentos, maioria condenado por crimes de tráfico de entorpecentes, gozavam de benefícios concedidos de forma ilegal, que incluíam autorizações de saídas e transferências de presídios, sob a arquitetura do juiz José Geraldo da Rocha Barros Palmeira, na época Juiz das Execuções Penais e Corregedor Geral dos Presídios, “secundado, de forma generosa e complacente, pelo último denunciado - Dr. Mauro Delfino César, então Promotor de Justiça oficiante naquele órgão, responsável pela fiscalização do mesmo”.

“Emergiu, também, dos trabalhos dessas comissões, a existência de promiscuidade no relacionamento sexual entre detentas do Presídio Feminino de Santo Antônio de Leverger, que eram levadas quinzenalmente, em ônibus do Estado, à penitenciária do Pascoal Ramos, nesta cidade, sob a ordem do primeiro denunciado - Dr. José Geraldo da Rocha Barros Palmeira, para realizar congressos sexuais entre os reeducandos, fatos que também eram do conhecimento do Promotor de Justiça, ali oficiante, e ora o último denunciado - Dr. Mauro Delfino César”, revela trecho do acórdão.

Confira o voto do desembargado Lessa

VOTO(26-2-98)

O SR. DES. PAULO INÁCIO DIAS LESSA (7º. VOGAL)
Senhor Presidente:

Egrégio Tribunal Pleno:

Pedi vista dos autos não só em razão da complexidade dos fatos narrados, mas principalmente em razão da divergência entre os votos precedentes.

Após a análise minuciosa dos autos entendo que os pressupostos legais para o prosseguimento da ação sobressaem tranqüilos dos elementos até agora trazidos aos autos, razão pela qual, com a devida "vênia" dos entendimentos contrários, voto pelo recebimento da denúncia.

E assim o faço, em razão de que eventuais dúvidas, nesta fase processual, não militam em favor dos denunciados, mas sim inversamente em favor da sociedade e principalmente do Poder Judiciário que viu-se envolvido, através da denúncia lançada contra um de seus integrantes. E após a denúncia, um dos denunciados lançou acusações contra três Juízes de Direito, titulares da Comissão Auxiliar da Corregedoria, além de ataques contra o próprio Presidente deste Tribunal.

Não se pode sonegar da comunidade a apuração das acusações lançadas e muito menos dos próprios denunciados em provar a impertinência das acusações, as dúvidas devem ser extirpadas a bem da paz social e da segurança dos poderes constituídos, sendo de todo inadmissível de antemão rechaçar as graves acusações, é de se permitir a apuração dos fatos.

"Peço vênia" aos eminentes pares para ler partes da denúncia:
"A partir do mês de abril do corrente ano, a imprensa local veiculou, em seus principais órgãos de comunicação, notícias de privilégios ilegais concedidos a traficantes de drogas e práticas de prostituição entre detentos da Penitenciária de Pascoal Ramos e detentas do Presídio Feminino de Santo Antônio de Leverger.

Em conseqüência, instalou-se no âmbito do Ministério Público, da Secretaria de Justiça e do Poder Judiciário, comissões destinadas a proceder completa apuração dos fatos.

E, efetivamente, como se demonstrará, descobriu-se que vários detentos, notadamente os processados por crimes de tráfico de entorpecentes, recolhidos nos estabelecimentos penais da Capital, gozavam de benefícios concedidos ao mais completo arrepio da lei, que incluíam criminosas "autorizações de saídas" e "transferências de presídios", sob a organização e planejamento da autoridade responsável pela Vara das Execuções Penais e Corregedoria-Geral dos Presídios, o aqui primeiro denunciado, Dr. José Geraldo Barros da Rocha Palmeira, Juiz de Direito, com a complacência do também acusado, Dr. Mauro Delfino Cesar, Promotor de Justiça, oficiante na referida Vara e responsável direto pela fiscalização dos estabelecimentos penitenciários, ilícitos que contavam com a ativa e consciente participação dos demais acusados.

Veio à tona, também, a degradante promiscuidade existente no relacionamento sexual entre detentas do Presídio Feminino de Santo Antônio de Leverger, que eram levadas, quinzenalmente, por ordem direta do Magistrado acusado, em ônibus e viaturas da Secretaria de Justiça, à Penitenciária de Pascoal Ramos, para "encontros íntimos" com os reeducandos ali custodiados, fato que era, também, do pleno conhecimento do Promotor de Justiça, ora acusado, que omitiu-se quanto às providências de seus mister.

Diante, pois, de tudo o quanto foi apurado pelas comissões, através de farta prova testemunhal, documental e pericial, cuja documentação serve de lastro à presente, restaram comprovados, de suas condutas, os seguintes ilícitos penais:..."

Descreve em minúcias a vestibular acusatória onze condutas ilícitas comissivas e omissivas, aduz ainda que: "... restou esclarecido que os acusados José Geraldo Palmeira, José Ribeiro Viana e Cesarino Delfino Cesar, passaram a adquirir apartamento e veículos novos, nacionais e importados, ..." e, especificamente contra o magistrado, afirma:

"Constatou-se que, apenas no período compreendido entre fevereiro e março deste ano, o acusado José Geraldo Palmeira adquiriu 05 (cinco) veículos, três nacionais e dois importados: um Fiat Tempra-placas JYB-5191, um GM Ômega CD-placas BET-0790, um Ford Escort XR3-placas AZ-0900, um Suzuki Swift HT-placas JYS-1313 e um Mitsubishi Eclipse-placas KAK-3333......."
Completando:

"O acusado José Geraldo Palmeira adquiriu a Waldir Antonio Serafim da Silva, no mês de abril do corrente ano, um apartamento no Edifício Goldem Garden, nesta cidade, ao preço de US$ 200.000,00 (duzentos mil dólares), dando como parte de pagamento, relativa à entrada, dois veículos..."

Eminentes colegas, como consignado no relatório da lavra do Desembargador Flávio José Bertin, que resumiu com maestria as condutas atribuídas aos denunciados, incluindo daquele integrante deste Poder, tenho que cumpre-me repisar, não os detalhes dos fatos, mas apenas e tão-somente os dispositivos penais que foram endereçados ao magistrado Dr. José Geraldo da Rocha Barros Palmeira, transcrevendo os artigos citados:

l. - Crime contra a administração pública, concussão, seis vezes em concurso material (art. 316 c/c art. 69 do CP).

"Art. 316. Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida: Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa".

2. - Crime contra a fé pública com agravante da função pública, duas vezes e em concurso material (art. 299, parágrafo único c/c art. 69 do CP).

"Art. 299. Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:

Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, se o documento e particular.

Parágrafo único. Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte".

3. - Crime contra a administração pública em continuidade de crime contra os costumes (art. 337 e art. 228, na forma do art. 71 caput do CP.)

"Art.337. Subtrair, ou inutilizar, total ou parcialmente, livro oficial, processo ou documento confiado à custódia de funcionário, em razão de ofício, ou de particular em serviço público: Pena - reclusão, de dois a cinco anos, se o fato não constitui crime mais grave.

Art. 228. Induzir ou atrair alguém à prostituição, facilitá-la ou impedir que alguém a abandone: Pena - reclusão, de dois a cinco anos."
Eminentes pares, as acusações são substanciosas, ensejam apuração.

A recusa em dar prosseguimento a persecutio criminis, não pode ficar estribada nos pretendidos desmentidos das testemunhas, até a ocasião ouvidas, como concluiu o eminente Desembargador Relator, que rechaçou individualmente as denúncias lançadas, "por considerar improcedentes as acusações."

O entendimento do Desembargador Relator de que:
"Observados os elementos narrativos da denúncia e cotejados os mesmos com os suportes fáticos por ela apresentados, chega-se a conclusão, eminentes pares, da improcedência, da inépcia da peça vestibular acusatória."

Pelos mesmos motivos, data vênia, concluí na direção diametralmente oposta, pelo recebimento da denúncia, apesar do brilho dos votos escritos dos eminentes Desembargadores Flávio José Bertin e Wandyr Clait Duarte.

Busco inicialmente as abalizadas lições do jurista italiano Cesare Beccaria, que no século XVIII assentou algumas das bases do direito penal no mundo moderno, o qual ao afirmar que nada é mais perigoso do que o axioma comum de que é necessário consultar o espírito da lei, lecionava:

"Em cada delito, o juiz deve formular um silogismo perfeito: a premissa maior deve ser a lei geral; a menor, a ação em conformidade ou não com a lei: consequência, a liberdade ou a pena. Quando o juiz for coagido, ou quiser formular mesmo que só dois silogismos, estará aberta a porta à incerteza." (in Dos delitos e das penas, Ed. Martins Fontes - ed. Bras., 1991, p. 48)
Seguindo esta lição, consignei acima os dispositivos legais, passo agora a demonstrar as premissas, ou seja, a lei geral e os fatos. Assim, registro que na denúncia foram arroladas vinte e uma (21) vítimas, destas dezesseis ainda estavam presas e quatorze (14) testemunhas (fls.28/29-TJ).

Os relatórios da sindicância lavrados pela Comissão Auxiliar da Corregedoria Geral da Justiça designada pelo Presidente deste Tribunal, Desembargador Salvador Pompeu de Barros Filho, e integrada pelos Juízes de Direito: Dra. Maria Erotides Kneip Macêdo, Dra. Graciema Ribeiro de Caravellas, Dr. Rui Ramos Ribeiro (que saiu depois) e Dr. Antônio Paulo da Costa Carvalho, que se encontram incrustados nos autos a fls. 50/110, trazem narrativa de fatos estarrecedores da atuação do Juiz de Direito titular da Vara de Execuções Penais, que precisam, necessitam com premência de completa apuração e se pertinentes de exemplar punição.

Denunciantes ou denunciados, um dos dois precisam da punição judicial. Inadmissível é a situação da inércia, da omissão, possível apenas sob o escudo de um tecnicismo exagerado e escusativas pueris.

A ignomínia dos atos narrados, se restarem provados merece intensa reprovabilidade. Restando negativa as provas o Ministério Público, detentor do dominus litis, deve tomar as providências contra os acusadores.

A punição como ensina Mirabete, é a justa reação do Estado contra o autor da infração penal, em nome da defesa da ordem e da boa convivência entre os cidadãos, mas somente podendo ser realizado o direito-poder de punir através do processo penal (in Processo Penal, 5ª. ed., Atlas, 1996, p. 24/5).

Cabe ao Estado a função jurisdicional de dar a cada um o que é seu, aplicando o direito objetivo à situação concreta, e esta função pelo mandamento constitucional somente é admitida através do processo legal, ou seja, via ação, definida por Fernando da Costa Tourinho Filho como: "o direito subjetivo de se invocar do Estado-Juiz a aplicação do direito objetivo a um caso concreto. Tal direito é público, subjetivo, autônomo, específico, determinado e abstrato" (ob. cit. p. 104).

No caso em tela, [EPC1][EPC2]por força do disposto no art. 6º. da Lei nº. 8.038, de 28 de maio de 1990, compete ao Tribunal deliberar "sobre o recebimento, rejeição da denúncia ou da queixa, ou a improcedência da acusação, se a decisão não depender de outras provas". Então nesta fase afere-se, exercendo juízo de prelibação, considerando as contra-provas dos denunciados, exclusivamente a presença dos requisitos exigidos pelo art. 41 do Código de Processo Penal, verbis:

"A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol de testemunhas."
Dispondo expressamente a Lei Adjetiva Penal que não se dará início à instrução criminal quando:

"Art. 43. A denúncia ou queixa será rejeitada quando:
I - o fato narrado evidentemente não constituir crime;
II - já estiver extinta a punibilidade, pela prescrição ou outra causa;
III - for manifesta a ilegitimidade da parte ou faltar condição exigida pela lei para o exercício da ação penal."

No estudo percuciente que fiz dos autos, compostos por cinco (05) volumes, cada um com mais de 500 (quinhentas) páginas, totalizando 2.602 (duas mil, seiscentos e duas) páginas, mais dois adendos com quase 400 páginas, e as notas taquigráficas com 94 (noventa e quatro) páginas, confesso aos nobres pares que não encontrei nenhuma, absolutamente nenhuma das causas impeditivas da instauração da ação penal.

A denúncia veio subscrita pelo Procurador-Geral de Justiça em substituição, Attílio Ourives, lastreada nos Relatórios da Comissão Auxiliar da Corregedoria Geral de Justiça criada especialmente para apurar eventuais irregularidades ocorridas na Vara de Execuções Penais e nos presídios desta Capital (Portaria nº 168/94-TJ).

Relatórios estes que vieram aos autos, acompanhados de farta documentação (fls.111 a 986-TJ), inclusive relatórios também da Correição no âmbito do Ministério Público e Sindicância no âmbito da Secretaria de Estado, provas que a meu entender são mais que suficientes para demonstrar indícios de autoria e materialidade, propiciando a instauração da ação penal, sendo despiciendas as alegações apresentadas pelas defesas, no sentido de que o Magistrado e o Promotor Público, foram inocentados nos processos administrativos, até porque a responsabilidade penal, independe da administrativa, a qual ressalte-se tem o procedimento de menor complexidade.

As manobras diversionistas encetadas pelos profissionais que patrocinam as defesas dos denunciados merecem os mais sinceros elogios pela competência com que foram realizadas, conquanto as tenho como inaptas para alterar minha visão de todo o processado.

Entupiram os autos com acusações, argumentações, provas e recursos, representando mais da metade das páginas do processo, só a defesa do denunciado magistrado colaborou com dois volumes dos autos (fls. 1220/2437), o que a meu ver, por si só demonstra a imperiosa necessidade de apurar-se integralmente os fatos.

As defesas prévias admitidas no procedimento especial, estendidas a todos os denunciados, foram rebatidas incisivamente nas quarenta e um laudas da lavra do Procurador-Geral de Justiça em substituição, Dr. Ulysses Ribeiro (fls. 2.444/2484-TJ), demonstrando que as provas não estão calcadas em testemunhos de presos condenados, como pretenderam imputar os denunciados, nem tampouco em pretensas perseguições promovidas pelos integrantes da Comissão, mas sim lastreadas inclusive nos depoimentos dos funcionários carcerários.

Além de outros depoimentos de funcionários encarregados de estabelecimentos prisionais e da Administração do Sistema Penitenciário, destacou aqueles prestados à comissão por: Beatriz Fátima Figueiredo (função adjunta da Diretoria da Cadeia Pública do Carumbé, por oito anos), (fls.193/4); Arnaldo da Silva Castro (Agente de Segurança Penitenciário desde 1986), (fls.195/7); Maildes Evangelista S. Pereira (funcionária do setor penal da Penitenciária Pascoal Ramos, há 10 anos), (fls.203/205); Marcilio Antonio da Silva (funcionário da Revisoria), (fls.206/7); Maurício Francisco Figueiredo (funcionário da Penitenciária Regional de Cuiabá, há 6 anos), (fls.208/9); Wânia Pereira de Souza (funcionária da Penitenciária Regional do setor revisional), (fls.213/5). Depoimentos que aqui não vou reproduzir, mas que todos apontam com veemência na direção da autoria e da materialidade dos fatos imputados aos denunciados.

Nobres pares, vou me permitir fazer uma incursão mais aprofundada nas provas apresentadas, apenas visando demonstrar-lhes as razões da minha convicção, mas o faço, não escolhendo uma das acusações, mas indo de encontro apenas contra a primeira das onze lançadas, evitando, assim, tornar cansativa a exposição.
Consta da denúncia:

"1) Em 14 de setembro de 1993, por ordem do Dr. José Geraldo da Rocha Barros Palmeira, Antonio Rodrigues Filho, Aparecido Rodrigues e Paulo Roberto Rodrigues, condenados por crime de tráfico de entorpecentes na Comarca de Presidente Prudente-SP, que se achavam cumprindo pena na Penitenciária de Pascoal Ramos, nesta capital, foram transferidos para a Cadeia Pública de Mirassol d'Oeste-MT."

Fato que por si só evidentemente não constitui crime. Mas no dizer da denúncia este caracterizou-se quando:

" No dia 19.08.93, o Dr. José Geraldo esteve na Penitenciária de Pascoal Ramos, ocasião em que recebeu em audiência, na sala da diretoria, o reeducando Antonio Rodrigues Filho e, atendendo a seu pedido, prometeu-lhe a transferência, após o que, sussurrando, indicou o nome do advogado Saulo Peralta, como intermediador da transação. No dia 23.08.93 deu-se o primeiro contato do acusado Saulo Peralta com o reeducando Antonio Rodrigues Filho na Penitenciária de Pascoal Ramos, o que se repetiu em 25 e 26 de agosto de 1993, sendo certo que, nesta última oportunidade, o próprio Dr. José Geraldo se encontrava presente".

Foi cobrado do reeducando US$ 30.000,00 (trinta mil dólares), que acabou pagando apenas US$ 25.000,00, sendo quinze mil dólares em espécie e o restante pela transferência de um veículo VW-Santana.

O elo de ligação entre o advogado Saulo Peralta e o Juiz de Direito, deu-se pela seguinte assertiva:

"Nota-se que o assíduo acompanhante do acusado Saulo Peralta, nas visitas aos reeducandos, era Antonio José de Freitas, Serventuário da Justiça da Comarca de Rondonópolis-MT., que foi subordinado direto do Juiz Palmeira naquela Comarca, tendo sido por ele nomeado Escrivão da 1ª. Vara Criminal em 14-3-90, através da Portaria nº. 044/90, seu homem de confiança".

Versão que foi corroborada pelos irmãos Rodrigues, Antônio, Paulo Roberto e Aparecido (fls.112/119-TJ), e pela genitora dos mesmos Dna. Anésia Queiroz (fls.217/19-TJ), quando ouvidos pela Comissão, a qual em seu relatório final (fls.60/65-TJ) menciona ainda os depoimentos dos reeducandos Marcos Maurício Gonçalves Pinho e Luiz Carlos Gomes da Silva sobre os fatos, demonstrou ainda que pelos assentos no livro de Registro de Entradas e Saídas de Pessoas, Funcionários e Reeducandos da Penitenciária Regional de Cuiabá, a veracidade dos depoimentos.
Até porque como foi consignado no Relatório (fls.65-TJ),

encontra-se registrado que no dia 26/08/93, todos reuniram-se nas dependências da Penitenciária, o Juiz de Direito Dr. José Geraldo, o Sr. Antonio José de Freitas, o Dr. Saulo Peralta, a Sra. Anésia e o recluso Antonio Rodrigues Freitas. (grifei).

Acrescente-se que também foi constatado que nos dias treze, catorze e dezesseis de setembro de 1993, o denunciado Saulo Peralta, esteve hospedado no Hotel Bandeirantes, aonde fora efetivado o pagamento, fotocópia da ficha de Registro de Hóspedes juntadas (fls.455/459-TJ).

Provas que além dos documentos pertinentes aos processos encontrarem-se nos autos (fls. 409/437-TJ), também vieram a estes, a Ficha de Firma, aberta perante o Cartório do 2º. Ofício de Mirassol D'Oeste em nome de Aparecido Rodrigues, na data afirmada que foi utilizado para a transferência do veículo e a cópia do contrato citado por Dª Anésia para o levantamento do dinheiro (fls. 463/466-TJ).

Para mim restou demonstrado o nexo, o liame de causalidade entre o despacho que decidiu pela transferência dos três reeducandos (Irmãos Rodrigues) da penitenciária de Cuiabá para a cadeia pública da cidade de Mirassol D'Oeste-MT, e o pagamento ao advogado indicado.

Restaram fortes evidências de que a indicação do profissional fora feita pelo Juiz de Direito, cujas tratativas foram acompanhadas por pessoa de sua confiança e coincidentemente esteve no presídio na mesma data em que foram ultimados os acertos financeiros, o que em tese caracterizaria crime de concussão, que vem a ser a vantagem indevida em razão da função pública.

Eminentes pares, se não bastassem estes elementos para fundamentar minha divergência com o Desembargador Relator, tomo a liberdade de acrescer simples análise de uma contraprova que veio aos autos na defesa daquele que se tem como o principal envolvido.

O DR. JOSÉ GERALDO DA ROCHA BARROS PALMEIRA, rechaçando as denúncias que lhe foram endereçadas, no que pertine a ostentação de riqueza, aduz que todas suas aquisições estão lançadas no seu Imposto de Renda, diz que vendeu uma casa, comprou um apartamento e trouxe todos os documentos da sua movimentação bancária (fls. 1348/1350).

Afirmou que em 18-2-94, vendeu a Joacy Gonçalves da Silva e sua mulher, uma casa sito à Rua Tóquio nº 158, no Bairro Shangri-lá, pelo preço de Cr$ 100.000.000,00 (CEM MILHÕES DE CRUZEIROS), dinheiro com o qual adquiriu, no mês seguinte, os veículos Fiat Tempra, o Ford Excort-XR3 e o Suzuki, que totalizou Cr$ 21.500.000,00, juntou documentos comprobatórios (fls. 2373/2380-TJ).

A fls. 2375-TJ, foi juntada a DECLARAÇÃO dos compradores do pagamento em dinheiro, firmada, também pelos vendedores e com a firma reconhecida perante o Cartório Xavier de Matos do Distrito de Coxipó da Ponte, em 22 de junho de 1994.

A par da estranheza da declaração, firmada por quem pagou, aferindo-se os extratos bancários juntados pelo denunciado (fls. 2393/2437-TJ), não se constata em nenhum dos bancos o depósito de tão alta soma, Cr$ 100.000.000,00 (cem milhões de cruzeiros), ou mesmo da metade, ou depósitos vultosos nas datas próximas da transação que noticiou, fato que tenho certeza, vem corroborar com os demais indícios de autoria e materialidade, impondo a busca da verdade real, afinal a nós Juízes é imposta uma barreira intransponível, no que pertine a independência. Lecionando o jurista Luiz Flávio Gomes, luminar de magistratura moderna, diz:

"Outro relevante aspecto do controle da independência e das atividades judiciais consiste em que, apesar do necessário abandono do positivismo-legalista, os juízes continuam vinculados à lei, sobretudo à Lei Maior que é a Constituição. Isso significa fundamentalmente que a jurisdição só pode ser exercida dentro dos limites legais e constitucionais vigentes, não sendo permitido ao juiz o chamado uso alternativo do direito, no sentido metajurídico, que consistiria na possibilidade de substituir os critérios dados pelo ordenamento jurídico pelo seus critérios pessoais na hora de julgar os conflitos de interesses." (in A Dimensão da Magistratura no Estado Constitucional e Democrático de Direito, 1ª. ed., 1997, RT, pág. 43/44).

Então, concluindo o silogismo de Beccaria e reportando-me a Mirabete: "Deve o Juiz receber a denúncia ou a queixa que preencher os requisitos do artigo 41 e não se encontrar em qualquer das situações previstas no artigo 43 do CPP."

A peça acusatória veio acompanhada de provas viabilizando a ação penal, a exordial não padece de inépcia substancial ou formal, não podendo impedir-se a formulação do libelo e apreciação da tipicidade, antijuricidade e culpabilidade das condutas atribuídas aos réus, importando a rejeição da denúncia, nesta fase, num autêntico cerceamento ao legítimo e necessário exercício da persecutio criminis.

Tenho que não basta aos acusados a simples rejeição da denúncia, pelo acinte, pelos desdobramentos, pelas interpretações, pelas conclusões que contra eles foram lançadas é de todo necessário a sentença, a decisão conclusiva da Justiça: os atos descritos são crimes? Praticaram os denunciados os atos que lhe foram imputados ou não praticaram ?

Não se pode admitir que continuem com a pecha que lhes fora lançadas e o julgamento da mídia a que foram submetidos, sob pena de trazer prejuízos no exercício de suas funções profissionais e jurisdicionais.

Acrescente-se que por si só, a assertiva de que as testemunhas se retrataram perante o Desembargador-Relator, quando ouvidas no processo administrativo, alegando que haviam sido pressionadas por aquela Comissão Auxiliar da Corregedoria, estaria a ensejar uma apuração mais acurada, por vários motivos:

Em primeiro lugar, por serem as testemunhas/vítimas condenadas por tráfico de drogas, isto, isoladamente, não elide a veracidade dos seus depoimentos, mormente por não ser apenas uma, mas várias, além de alguns familiares das mesmas, atribuindo aos acusados a mesma prática de delito.

Em segundo lugar, se houve pressão por parte dos membros da comissão já mencionada, para que houvesse a incriminação dos acusados, a verdade sobre tal fato é do interesse da justiça, para eventual atribuição de responsabilidade funcional e/ou criminal, a par de que os membros da referida comissão são magistrados de conduta respeitável e exemplar, razão pela qual se faz necessária uma acareação entre as testemunhas/vítimas e os membros da aludida comissão.

Em terceiro lugar, é de se apurar se essa famigerada pressão não poderia ter advindo dos próprios acusados, no sentido oposto para que as testemunhas se retratassem, como de fato e estranhamente de forma uníssona se retrataram, posto que, além de não estarem segregados preventivamente, pelo menos um deles é magistrado e nem sequer foi afastado, continuando no pleno exercício da judicatura, como se nada estivesse sendo apurado contra ele.
É de se ressaltar que um preso condenado em confronto com os interesses de um magistrado em pleno exercício das funções do seu cargo, é o mesmo que uma formiguinha em confronto com um elefante, quiçá uma manada de elefantes.

ASSIM, "data máxima vênia" do entendimento do nobre Desembargador Relator e dos eminentes pares que o acompanharam em seu voto, tenho como necessário o recebimento da denúncia lançada contra: Dr. JOSÉ GERALDO DA ROCHA BARROS PALMEIRA, DR. JOSÉ RIBEIRO VIANA, DR. CESARINO DELFINO CESAR, DR. SAULO PERALTA e DR. BENEDITO PEDROSO DE AMORIM FILHO, ao invés de julgá-la de plano improcedente, pois presentes os pressupostos legais para tanto, não para atender ao elevado clamor popular e da mídia, que como se sabe tem memória curta, e hoje, nem mais tratam dos fatos, mas para que todas as dúvidas sejam extirpadas e assim se faça a verdadeira e salutar justiça que é o nosso mister.

Inobstante entendo que a exordial acusatória errou em descrever os fatos praticados pelo Promotor Público Dr. MAURO DELFINO CÉSAR, imputando-os como ilícitos penais, como muito bem asseverou o Desembargador Wandyr Clait Duarte, a quem peço vênia, para integrar neste voto aquelas suas razões, para também rejeitar a denúncia contra o mesmo, por ausência de tipicidade dos fatos a ele imputados.
É como voto.



Imprimir