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Notícias / Cidades

Entenda quem era quem no esquema de grilagem praticado no Araguaia

Da Redação/Alline Marques

O esquema de venda de terras ilegais no Vale do Araguaia é antiga e já resultou em muitas mortes. Famílias inteiras assassinadas pela ganância por um pedaço de chão. Fazendeiros milionários e com uma movimentação na conta bancária de mais de R$ 8 milhões, segundo constatou a Polícia Federal durante a Operação Pluma, são os financiadores desta prática criminosa.

Em Mato Grosso a disputa por terra é sempre muito sangrenta, desde os tempos da colonização. Mas nos últimos anos, a grilagem vem sendo combatida. No último esquema desbaratado pela Polícia Federal, Gilberto Luiz de Rezende, o Gilbertão, é apontado como o grande mentor da organização criminosa.

De acordo com o inquérito da Polícia Federal, Gilbertão estimulava a invasão de terras da União, inclusive em reservas indígenas e privadas, por posseiros para depois expulsar os ocupantes, comprando a posse ou fazendo uso de violência física e moral.

Em seguida ele providenciava a emissão de títulos de domínio falsos para a comercialização dos lotes a médios e grandes fazendeiros e grupos empresariais. É justamente na expulsão desses posseiros, muitas vezes enganados pelo próprio líder da quadrilha, que os policiais militares atuam. A PF identificou a participação de seis PM’s no esquema. Muitas das vezes, coronéis utilizavam da estrutura da instituição para agir contra o patrimônio.

Além disso, os policiais, pagos para dar segurança à sociedade, instauravam um clima de medo e insegurança nas cidades do Vale do Araguaia, destacando-se Vila Rica, Santa Cruz do Xingu, Confresa, Porto Alegre do Norte, Ribeirão Cascalheira, Alto Boa Vista e São Félix do Araguaia. Vale notar que também contribuíram para o fomento das atividades criminosas empresários, policiais militares, pistoleiros do Estado de Goiás e financiadores do Distrito Federal.

Os policiais também incentivavam a invasão com a finalidade de vender segurança aos proprietários das terras. Elas ainda são efetivadas para forçar o proprietário a vendê-las a preço pífio, sendo que, após desocuparem a área, revendem-nas a preço de mercado.

A PF utilizou da interceptação telefônica e de quebra de sigilos bancário e fiscal para comprovar as práticas criminosas executadas pelos acusados.

Agora entenda como cada um atuava na quadrilha, conforme aponta o inquérito:

OPERADORES

Gilberto Luiz de Rezende:
É o chefe da organização criminosa, apontado em inúmeras passagens como responsável pela desocupação violenta de imóveis rurais, homicídios e tentativas de assassinatos, alem de ameaças. Já pesava contra ele um mandado de prisão preventiva pelo Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal de Rondonópolis; e de prisão temporária, pelo Tribunal de Justiça do Pará. Em 2003, a movimentação financeira de Gilberto Luiz de Rezende também alcança quase R$ 7 milhões de reais. Trata-se do lucro auferido pela venda ilícita de bens da União. O valor é totalmente incompatível com a fonte de renda oficial do grileiro.

Ademilson Luiz de Rezende:
É o irmão de Gilbertão e responsável pela venda de lotes da terra indígena. Ele é um dos principais membros da quadrilha, loteando e comercializando terras da União mediante uso de títulos de domínio falsos, razão da gigantesca movimentação financeira verificada, especialmente no ano de 2003, quando vendeu inúmeros lotes da Terra Indígena Marãwaitsede.

Altamiro Schneider:
Conhecido como “Nego Schneider” e atua em interação com Adalberto e Adário Carneiro, responsáveis pela entrada de drogas por Mato Grosso do Sul e por Barra do Garças/MT. São subordinados ao Tenente Cel. Elierson Metello, que, juntamente com o Tenente Cel. Rodrigues, é conivente com o tráfico de entorpecentes promovido. Nego também é apontado como responsável por contactar os proprietários de fazendas, normalmente residentes em outros Estados, exigindo 20% do valor da propriedade para desocupar a área, que antes fora invadida por terceiros contratados pelo bando, oportunidade em que os policiais militares promovem a desocupação e a quadrilha lucra com a “venda” da fazenda. Altamiro Schneider ainda atua como pistoleiro, praticando ameaças e homicídios, sendo suspeito da morte de Belonízio Souza Muniz e seu filho, Jean Carlos Ferreira Muniz, motivado, pelo que consta do inquérito policial acostado, por aquele não ter-lhe vendido suas terras.

Camilo de Lelis Brasileiro Pereira:
Conhecido como “Camilão”. Ele é químico residente em Confresa e apontado como responsável pela contratação de pistoleiros pela facção do Sub-Tenente Moreira e traficante de drogas. Ele atua também como intermediário entre os comandantes da Polícia Militar e os proprietários de fazendas invadidas. Segundo as investigações, Camilão intermedeia a relação entre o Cel. Metello e grandes fazendeiros da região, fornece serviços de pistoleiros vindos do Nordeste e promove a invasão de pequenas propriedades rurais, forçando a venda do lote por preço inferior ao de mercado. Uma série de homicídios e outros crimes são imputados a Camilo.

De acordo com uma testemunha, vítima das ameaças de Camilão, ele atua em conjunto com Gilbertão e o ex-prefeito de Porto Alegre do Norte, Luiz Carlos Machado, o Luiz Bang, inclusive ameaçando juízes da região e promovendo a invasão de terras da União. Há suspeita ainda que pagam propina para servidor do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária para agilizar a entrada na posse.

Luiz Carlos Machado:
Conhecido como “Luiz Bang” é apontado como pistoleiro e responsável por desmate, venda de áreas griladas, falsificação de escrituras e ameaças. Já ocupou o posto de 5º pistoleiro mais perigoso do país, tendo inclusive prestado depoimento em CPI instaurada sobre o tema em 1993 e é acusado de ser mandante de uma tentativa de homicídio contra três pessoas. Ele também foi preso por explorar trabalho escravo e por quebra-quebra na Câmara Municipal de Vereadores de Confresa.

FINANCIADORES

Adário Carneiro Filho:
É considerado um dos chefes do crime organizado na região, sendo inclusive chamado de “Comendador do Araguaia”, numa alusão a João Arcanjo Ribeiro. De acordo com as investigações iniciais realizadas pelo Grupo de Atuação e Combate ao Crime Organizado (Gaeco), ele possui negócios suspeitos com outros policiais, realizando pagamentos milionários aos agentes. Outros servidores também podem ter recebido dinheiro do financiado. Ele já foi preso por porte ilegal de arma, uma delas de uso restrito. Em documentos apreendidos, existem papéis que demonstram o pagamento a policiais. Adário apresenta movimentação financeira incompatível com a renda declarada nos anos de 2003 e 2005.

Jurandir de Souza Ribeiro:
Adquiriu área da terra indígena Marãwaitsede mediante utilização de título dominial com limites sobrepostos. Em seguida vendeu parte da terra a Admilson Luiz de Rezende.

SUPORTE TÉCNICO:

Antônio César Rocha Felipe:
É Responsável técnico pela delimitação da Fazenda Suiá Missú, como descrito acima, incluindo seus limites dentro da Terra Indígena Marãwaitsede.

Josemar Pereira dos Santos:
Técnico agrimensor responsável pelos mapas e memoriais descritivos utilizados nos desmembramentos das Fazendas Suiá Missú e Bridão Brasileiro, como descrito acima, mediante deslocamento de títulos.

Maria Elisabeth G. Carvalho:
Escrevente do Cartório de Registro de Imóveis de São Félix do Araguaia, tendo confeccionado matrículas e registros de lotes no interior da Terra Indígena Marãwaitsede, apesar de ciente dessa situação, atuando em conluio com Gilberto e Admilson Rezende e técnicos deste grupo.

Maristela Maranhão Fonseca:
Engenheira agrônoma responsável pela planta e memorial descritivos de delimitação da Fazenda Suiá Missú, apondo seus limites sobre parte da Terra Indígena Marãwaitsede.

POLICIAIS MILITARES:

Elierson Metello de Siqueira:
Tenente Coronel, ex-comandante do 2º BPM de Barra do Garças. Dá respaldo à ação dos subordinados mediante pagamento. As investigações apontam que o policial teria um patrimônio incompatível com seu salário, como imóveis em Barra do Garças, duas casas em bairros nobres em Cuiabá e diversos carros de ‘luxo’. Na época em que atuou no Vale do Araguaia como comandante, ele teria disponibilizado policiais, para serviço de vigilância a diversas casas comerciais, dentre as quais a Skol, Posto do Alencar (seu sogro) e Cartório do 1º ofício, mediante pagamento dos empresários. Acusado também de desviar parte dos recursos destinados a Polícia Militar, inclusive no caso de combustíveis.

A. E. de M. C.:
Ex-Comandante-Geral da Polícia Militar no Estado de Mato Grosso no período de janeiro a abril de 2007, quando deixou o cargo devido um dossiê apresentado ao governador contra ele. De acordo com as investigações, ele substituiu o coronel Metello em Barra do Garças e manteve a prática ilícita.

Há informações de que os filhos de A. E. de M. C. ganharam viagem a Disney paga por terceiros. São mais de trinta fazendas invadidas na região nesse esquema de cobrança de segurança pela PM. Ele também é suspeito de ter recebido cerca de 400 cabeças de gado do traficante Marquezan para facilitar o transporte e o envio de drogas na região de Cáceres, assim como de desviar verbas de alimentação e combustível da Polícia Militar, conforme apontam as investigações do Gaeco.

Adalberto da Cunha e Oliveira:
Sub-tenente da PM e homem de confiança de Metello. Ele teria repassado em fevereiro ou março de 2003, um pagamento de R$ 90 mil ao superior, como pagamento pelos serviços prestados pela quadrilha na Fazenda Bridão Brasileiro de Filamom Limoeiro. As investigações realizadas pelo Gaeco constatou a utilização de conta bancária de um dos envolvidos por outro, sendo Adalberto um deles. Também foi instaurado inquéritos em seu desfavor por posse de máquina de recarga de projéteis de arma de fogo e projéteis de uso restrito.

Uma testemunha que trabalhou na Fazenda Esmeralda informou ainda que presenciou a existência de um grupo armado, composto por policiais militares aposentados e outras pessoas que tinham forte arsenal – fuzil, carabina, pistola e revolveres. Uma apreensão de arma foi realizada por quatro policiais militares do destacamento da localidade conhecida como ‘Baianos’, e dentre eles estava o sub-tenente, então comandante daquela unidade. Só que não há informação de qualquer prisão ou apreensão das armas na Comarca de Porto Alegre do Norte.

O Gaeco apurou ainda que ele recebeu vários pagamentos de Adário Carneiro, de quem era bastante próximo, conforme documentação apreendida na residência do mesmo e testemunhas. Realizada rondas na fazenda Esmeralda, tendo um pagamento de R$ 18 mil mensais pelo trabalho.

Antônio de Moura Netto:
Capitão da PM e responsável pela violenta desocupação da Fazenda Bridão Brasileiro, como se vê.

Robson Oliveira Curi:
Capitão da PM/MT, subordinado cel. A. E. de M. C. e através de escutas telefônicas percebeu-se que foi um dos negociadores sobre a reintegração de posse de fazenda na região de Vila Rica. Também foi detectado que Curi teria sido orientado a transferir um aspirante, porque estaria falando demais, pois informou a um major que “se sair da região não tem problema, pois irá ganhar R$30 mil de seu pai, provenientes da venda do ‘Atacadão’”. A empresa foi adquirida recentemente pelo grupo Carrefour.

Wlamir Luis da Gama Figueiredo:
Major da PM/MT, apontado como o encarregado da arrecadação e repasse da propina recebida ao Tenente Coronel Metello e interage com Adário Carneiro.

GRILEIRO

José Carlos de Morais:

Suspeito de receber R$150 mil do proprietário da Fazenda Codeara, em Santa Terezinha/MT, para retirada de invasores por três oportunidades, sendo que as invasões eram estimuladas pelo soldado Pereira. Ainda, indica-se que tenha recebido dinheiro para a desocupação da Fazenda Uirapuru, em Porto Alegre do Norte, juntamente com o Coronel A. E. de M. C. e o Capitão Curi.

FAZENDEIRO

Romão Ribeiro Flor:
Conforme apurado pela PF, é beneficiário do esquema consistente na expulsão de pequenos posseiros e posterior titulação falsa em nome de grandes proprietários, e seria o responsável, juntamente com terceiro, pelo pagamento de advogados que estariam dificultando o processo de desapropriação da Fazenda Suiá Missú.
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