“Atenção pais, neste dia 12 de outubro vou sortear um presente para o futuro das crianças... principalmente para aquelas que trucam os pais, os professores, os mais velhos, estes anjinhos que acham que tem direito sempre à última resposta... Eis aí o remédio (imagem de um chicote de três pontas)... garanto que duas ou três puxadas bem dadas no lombo (quando merecer) cura tudo isso e ensina a ser gente... e não me venha com essa de conversar... que doma racional para mal educado não funciona nem com cavalo”. A postagem feita no último dia 11 pelo vereador de Lucas do Rio Verde (a 335 km de Cuiabá), Airton Callai (PSB), tem gerado polêmica nas redes sociais. Em pouco mais de 24 horas, a postagem recebeu mais de 300 curtidas de apoiadores e conta com mais de cem comentários.
Para o professor doutor em Sociologia pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Naldson Ramos, pai de seis filhos, defender tal "pensamento autoritário e ultrapassado é inaceitável" e não cabe à figura de um legislador. “Ninguém tem direito de dizer qual a melhor maneira de educar uma criança, principalmente um leigo".
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“Pensa num presente maravilhoso”, comentou uma internauta na postagem do vereador, referindo-se ao chicote de couro, de três pontas, objeto comprável somente em lojas para animais de montagem.
“Na minha época ganhava-se com muita frequência esse presente...e sempre digo aqui em casa se hoje não tivéssemos essas leis cheias de mi mi nossos jovens seriam bem melhores do que tenho visto e lido por ai”, acrescentou.
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Outro internauta critica a atuação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), legislação que protege crianças e jovens do trabalho infantil.
“Sabe, tem momentos que esse maldito Eca veio para deixar esse bando de traquinas com falta de vontade de trabalhar e ainda tem coragem de dizer que uma correção de varinhas faz mal por isso que está feia a coisa é só bandidos. Para trabalhar não podem mais namorar roubar matar isso pode você percebe isso Callai?”
Vereador Airton Callai (PSD)
Avaliação:
“Ninguém tem direito de dizer qual a melhor maneira de educar uma criança, principalmente um leigo", dispara o professor doutor em Sociologia pela UFMT, Naldson Ramos. "Mesmo um psicopedagogo ou psicólogo, analisando o comportamento de um adolescente, não recomendaria o chicote, tapa ou o castigo".
O professor, que é pai de 6 filhos, sendo duas adoções, destaca que os profissionais da educação defendem sempre o diálogo, na orientação e na imposição de limites sem que isso implique em castigos, como a mais indicada forma de lidar com o comportamento infantil no âmbito da família. “Quanto mais autoritarismo, força e violência na força de educar, mais faremos com que estas crianças reproduzam comportamentos violentos quando adultos".
Naldson Ramos condenou a manifestação do vereador mato-grossense. "Comportamento autoritário na educação é coisa que não convém, principalmente partindo de uma autoridade, representante de uma parcela significativa da população. Não cabe este tipo de comentário a um legislador, a que cabe a função de legislar e propor projetos de proteção à criança e ao adolescente, na área do esporte, do lazer e da cultura, e não ficar dando receita de como educar filhos, com base na violência, no castigo e em um pensamento autoritário, ultrapassado e inaceitável pela sociedade. Não é assim que vamos construir uma sociedade sadia”, afirma.
Apoio nas redes:
Sobre a quase unanimidade dos comentários no Facebook apoiando a violência como método de doutrina infantil, o professor lamenta. “As redes sociais são importantes como canais de comunicação e veiculação de informação. Todavia, como todo instrumento de tecnologia, ela tem seu aspecto positivo e negativo. O aspecto negativo é a veiculação de determinados pensamentos como este, autoritário, fascista, que não coaduna com o atual momento em que vivemos do Estado democrático de direito".
Professor Naldson Ramos
O professor explica por fim a força que o reacioniarismo ganha nas redes sociais. "Esse tipo de pensamento tem uma capacidade de expansão muito grande e sem a menor reflexão sobre ela. As pessoas hoje estão muito desiludidas com as instituições, à começar pela própria família e juventude, por conta da violência e da criminalidade envolvendo jovens. Isso tem deixado a população desiludida com o processo legal e legitimo de solução destes conflitos, sobretudo a educação. As redes sociais possibilitam um comportamento que chamaria de covarde. Na medida em que se joga um pensamento lá, apoiando determinadas idéias e não fica para dialogar com aqueles que tem alguma contribuição para dar. Quando alguém oferece uma contribuição para o debate, dentro deste grupo, são taxadas de ‘esquerdopatas’ etc".
O que diz a Lei:
O que poucos sabem é que desde 27 de Junho de 2014 está em vigor a Lei Menino Bernardo (Lei 13.010/2014), que altera o ECA (Lei 8.069). O novo texto torna crime o uso de castigo físico ou tratamento cruel ou degradante como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto contra crianças ou adolescentes. O Poder Executivo enviou o projeto ao Congresso em 2010. O novo texto atende a uma disposição firmada ainda em 2006 na Organização das Nações Unidas (ONU).
A lei é clara em seu Artigo 18: “É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor”.
Assim, pais ou responsáveis que usarem castigo físico ou tratamento cruel e degradante contra o menor estão sujeitos a advertência, encaminhamento para tratamento psicológico e orientação. As medidas serão aplicadas pelo Conselho Tutelar mais próximo.
Autor:
Ao Olhar Direto, o vereador informou que irá se manifestar em breve, se achar necessário.
