Dois relatórios da Controladoria Geral do Estado apontaram diversas irregularidades nos contratos de operação e manutenção de oito unidades do Ganha Tempo em Mato Grosso. Além de contabilização de atendimentos não realizados e não manutenção de quantidade mínima de pessoal, uma cláusula dos contratos também garantiria que a empresa tivesse lucros exorbitantes. O Governo do Estado afirmou que está realizando análise das inconsistências.
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A CGE narra que o Contrato nº 63/2017/SETAS tinha por objeto a implantação, gestão, operação e manutenção de sete unidades de atendimento Ganha Tempo, nos municípios de Barra do Garças, Cáceres, Lucas do Rio Verde, Rondonópolis, Sinop, Várzea Grande e Cuiabá, na região da Morada da Serra. A vencedora foi a empresa Rio Verde Ganha Tempo SPE S/A.
O valor inicial da contratação era de R$ 398.707.945,30, correspondente à receita estimada da Concessionária ao longo do prazo da Concessão Administrativa, 15 anos. A unidade de atendimento do Ganha Tempo Ipiranga foi acrescida ao contrato por meio de aditamento celebrado em 11 de maio de 2018. Com o acréscimo, o valor estimado da contratação, para o período de 15 anos, passou a ser de R$ 461.032.821,30
A CGE apontou irregularidades com relação à distribuição de senhas, nos processos de congelamento e descongelamento de senhas, bem como tempo de espera significativamente abaixo dos padrões (média de até 30 segundos), e computação de senhas que haviam sido canceladas, ou seja, registrou mais atendimentos do que os que foram de fato realizados.
“O cômputo irregular de senhas como efetivo atendimento pela Concessionária, seja ocasionada por emissões ou replicações indevidas, seja pelo não cancelamento de senhas emitidas e objeto de desistência de usuários, implica em prejuízo significativo ao erário, além de configurar uma prática gravíssima que enseja, dentre outras medidas, e observado o devido processo administrativo, a aplicação de penalidade, bem como a retenção dos valores pagos ou liquidados indevidamente”, diz trecho do relatório.
Além disso, a empresa não instalou sistemas de segurança, como gravação de áudio dos atendimentos, e alerta de quando determinada espera ou atendimento estaria fora do tempo máximo permitido. Também foram constatadas inconsistências e incoerências nas avaliações recebidas.
“Ante a ausência de controles adequados para coibir tais práticas, e considerando as evidências demonstradas neste relatório de práticas da Concessionária no sentido de elevar indevidamente sua remuneração, tem-se que a manutenção dos serviços do Infocentro implicam, cumulativamente, em riscos, vulberabilidades e antieconomicidade no Contrato”.
No documento a CGE também cita que a empresa não manteve, ao longo do ano, o quantitativo mínimo de pessoal estipulado.
A empresa justificou que “os campos não preenchidos no quantitativo de funcionários não impactavam na parte operacional”. Afirmou também que a quantidade de “atendentes então constantes nas Unidades atendiam aos serviços instalados no momento (demanda real do período). Destaca que a demanda continuava abaixo de 60%, e que caso houvesse evolução dos atendimentos através da inserção de novos órgãos/serviços, haveria contratações de atendentes”.
Também foram apontadas inconsistências na projeção de gastos com pessoal, sendo que a CGE avaliou que o impacto desta inconsistência ao longo de toda a vigência do contrato é da ordem de R$ 44.639.954,00.
A CGE ainda apontou que o Contrato de Concessão, em sua cláusula 18.4.5, estabelece que na hipótese de haver variação da Demanda Real em relação à Demanda Projetada, a Concessionária fica autorizada a realizar atendimentos até 50% a mais do que a Demanda Projetada. Desta forma, a empresa teria lucros exorbitantes.
“Ressalta-se ainda que, seguindo a literalidade da cláusula 18.4.5 do Contrato, a autorização para o atendimento desse excesso de demanda (de 50%) poderia ocorrer de forma cumulativa. Sendo assim, se um determinado ano (X1) a Concessionária obtivesse os 50% de excesso (100% + 50% em X1), como o cálculo considera os últimos 12 meses, no ano seguinte (X2) ela poderia se beneficiar de uma demanda real correspondente a 225% da projetada no ano de referência (X1) [18]. Assim, tal fator implica em um risco financeiro à Administração que varia de 00 a 190 milhões de reais ao longo dos próximos 14 anos de vigência do Contrato”
O órgão afirma que mesmo que esta ocorrência se desse uma única vez ao longo da vigência contratual, implicaria na elevação dos lucros da Concessionária em mais de 27 milhões de reais, o que representa um valor superior à soma de todos os investimentos iniciais realizados pela empresa.
Por meio de nota o Governo do Estado afirmou que a Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag) assumiu a gestão do contrato do programa Ganha Tempo recentemente e que estão sendo realizadas análises das inconsistências apontadas pela CGE. O Governo também disse que serão implementadas ações para fins de reequilíbrio econômico e financeiro do contrato.
Leia a nota na íntegra:
A Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag) informa que assumiu a gestão do contrato do programa Ganha Tempo recentemente e que está realizando análises das inconsistências citadas pela auditoria da Controladoria Geral do Estado na execução do contrato, bem como nos demais aspectos econômicos e financeiros que impactam na contratação, inclusive aspectos de modelagem que podem influenciar no lucro do parceiro privado.
A partir deste levantamento serão implementadas ações para fins de reequilíbrio econômico e financeiro do contrato. A Secretaria está elaborando um plano de providências visando sanar as irregularidades apontadas e a empresa já está sendo notificada.
A Seplag informa também que o Estado reteve o pagamento dos atendimentos com duração de 30 segundos, ou seja, a empresa não recebeu pelos referidos atendimentos citados pela auditoria e exigiu da concessionária no momento do atendimento a identificação individual do cidadão, possibilitando uma fiscalização mais eficaz e garantindo com essa medida maior segurança da informação.
A secretaria estuda a possibilidade de instituir gerentes nas unidades do Ganha Tempo com vistas a dar maior fidedignidade à qualidade da prestação dos serviços. Também será publicada nos próximos dias uma portaria designando como fiscais todos os servidores públicos supervisores de cada órgão que compõe as unidades do Ganha Tempo, perfazendo aproximadamente 80 fiscais que também fiscalizarão os serviços prestados pela empresa Rio Verde.
Assim que a Seplag assumiu a gestão do contrato foi criada na estrutura da Secretaria um setor especifico para gerir o contrato. A equipe está fazendo diligências sistemáticas in loco para fiscalizar os serviços prestados pela empresa e de imediato, no caso de impropriedades, notificando e penalizando a contratada.
Quanto ao parecer do Ministério Público de Contas pela rescisão do contrato, a secretaria informa que ainda não foi notificada e que aguarda decisão do Tribunal de Contas do Estado.