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ENTREVISTA EXCLUSIVA

Criticada após dizer que prenderia jornalistas, Selma afirma que nota de sindicato é "patifaria"

14 Dez 2016 - 12:26

Da Redação - Paulo Victor Fanaia Teixeira

Foto: Rogério Florentino Pereira/OD

Selma Rosane Arruda

Selma Rosane Arruda

“Não foi ameaça, foi advertência”, explica a magistrada da Sétima Vara Criminal, Selma Rosane Arruda, que vive momentos difíceis com a imprensa regional. Isto por conta da audiência desta segunda-feira (12), que interrogou o delator premiado Giovani Belatto Guizardi, em ação penal oriunda da Operação Rêmora, em que afirmou que prenderia jornalistas que não tirassem do ar fotos publicadas da audiência.

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Para proibir veiculação de imagens do réu, a juíza interrompeu o andamento da audiência para determinar, em ríspido tom de voz, que sites fizessem alterações dentro de "30 segundos", ou repórteres presentes no local seriam presos em flagrante. O incidente gerou polêmica após publicações de notas do Sindicato dos Jornalistas de Mato Grosso (Sindjor-MT), da Associação dos Magistrados de Mato Grosso (AMM), Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Mato Grosso (OAB-MT). Para a juíza, trata-se de um “mimimi” sobre um assunto sério.

“O que fiz está previsto na Lei 12.850/2013: Art. 18. Revelar a identidade, fotografar ou filmar o colaborador, sem sua prévia autorização por escrito: Pena - reclusão, de 01 a 03 anos, e multa. Ora, eu adverti os presentes. Os repórteres estavam em estado de flagrante e eu não poderia ser omissa, é o mesmo que se eu flagrasse alguém sendo roubado, é minha obrigação dar voz de prisão”, explica a magistrada Selma Rosane Arruda, que se diz irritada com o ocorrido. “Me pegaram para Cristo".

A magistrada ainda lamentou a repercussão negativa do fato na imprensa local e a proporção que tomou, chegando a ser notícia em sites nacionais. “Sinceramente, eu não vejo razão para tanto mimimi, a OAB-MT, ainda pior, ao invés de defender as prerrogativas dos advogados usa o fato como pretexto para defender a lei do abuso de autoridade. Espero que deste fato, quanto menos polêmica houver, melhor”, afirmou a juíza.

Questionada por Olhar Jurídico se considera o ocorrido um “mal entendido”, ela nega. Diz que foi uma atitude baixa tomada pela imprensa. "Não houve mal entendido”. Adiante, reflete. “A imprensa precisa entender que ninguém está imune à lei”, e acrecentou. "Em todos estes anos eu nunca vi uma coisa tão baixa na minha vida".

Ainda, questiona a nota publicada pelo Sindjor-MT, que defende os trabalhadores da imprensa do Estado. “Eles sequer ouviram a minha versão, compraram o que foi dito e fizeram aquela patifaria. Foi um absurdo que feriu o princípio ético do jornalismo, em cima de uma coisa pequena”.

Olhar Jurídico argumenta que repórteres haviam entendido que seriam proibidas imagens "durante o interrogatório" (que entende-se iniciado a partir do momento que o juiz toma a palavra) de modo que estavam permitidas imagens feitas "antes do início da audiência", (do réu chegando, se sentando à mesa, se preparando, etc) ainda que na sala de audiências. "No site de vocês (Olhar Direto) havia uma foto do delator sentado de frente para a juíza, não estava permitido", rebate Selma.

Ao contrário do que fora "adiantado" em alguns blogs de notícia, a juíza não irá proibir entrada de jornalistas na audiência. "Não é verdade", diz, todavia adianta que partir de agora haverá controle maior de quem entra e sai daquela Vara durante audiências, principalmente quando envolver interrogatório com delator premiado, explica Selma, que lamenta os maus momentos que vive com a imprensa.

“Lamento muito o ocorrido, a intenção sempre foi dar transparência aos atos praticados naquela Vara. Ora, eu poderia ter prendido os repórteres, mas não prendi por respeito. A imprensa é um dos institutos que mais tenho respeito”. A magistrada, à tempo, ainda explica um detalhe. "Quando disse 30 segundos, quis dizer 'imediatamente'".

Voz de Prisão:

Na ocasião foram interrogarados dois delatores premiados do processo que julga esquema de fraude em licitação e cobrança de propina na Secretaria de Estado de Educação (Seduc). Foram ouvidosos colaboradores premiados Luiz Fernando da Costa Rondon, dono da Luma Construtora, e Giovanni Belatto Guizardi, proprietário do Dínamo Construtora, personagem central da polêmica.

Jornalistas de vários sites cobriam ao vivo a audiência naquela tarde, fazendo imagens para sites e TVs da chegada do delator na sala de audiência, e dele sentando-se à mesa, antes do interrogatóro, sem qualquer manifestação informal da defesa e do réu, que inclusive olhava para as câmeras enquanto era fotografado.

Todavia, antes de iniciar o rito, o advogado George Andrade Alves, que defende Guizardi, solicita a magistrada que imagens do delator sejam vetadas durante o ato do interrogatório. A mesma concorda e adverte os presentes. Imagens não seriam admitidas durante oitiva com o réu. Repórteres concordam e, a partir daquele instante, desligam suas câmeras. 

Poucas horas depois, a audiência é interrompida com o aviso da juíza de que os sites estavam descumprindo o determinado e publicando fotos do interrogatório. E avisou com tom de voz ríspido: "Vou dar 30 segundos para os senhores retirarem as fotos [...] Se não retirar, vou mandar prender”. 

Porém, como quase todos os repórteres presentes dependem da redação para efetuar a troca, alguns foram mais rápidos que outros no cumprimento da ordem. Os que não haviam trocado dentro de alguns minutos foram novamente abordados. “Você precisa de quantos minutos para tirar essa imagem do ar ou eu terei que te prender?”.

Assustada, uma repórter chegou a argumentar que não dependia dela e que o aviso já havia sido levado à seus superiores e que aguardava a troca. A magistrada se irritou. “Para inserir fotos vocês são rápidos, agora para retirar vocês demoram”.

O tratamento foi dado na frente dos advogados, colegas e de promotores do Ministério Público Estadual (MPE) presentes, que perplexos com a situação, não esboçaram reação. Para garantir a troca e encerrar o assunto, a defesa de Guizardi solicitou 15 minutos de intervalo.

Sites de notícia de Mato Grosso publicaram nota condenando a atitude da juíza. “Um tratamento desnecessário e uma demonstração de desrespeito aos profissionais da imprensa”, destacou o MídiaNews.

A AMAM publicou na manhã desta quarta-feira (14) a seguinte nota de apoio à magistrada:

A Associação dos Magistrados de Mato Grosso – AMAM vem, por meio desta, repudiar notícias publicadas por alguns veículos de comunicação e notas divulgadas por algumas entidades representativas de classe sobre o suposto abuso de autoridade praticado pela magistrada Selma Arruda, da 7ª Vara Criminal de Cuiabá, durante a audiência recente de inquirição de um colaborador da denominada Operação Rêmora, realizada na última segunda-feira (12).

A imagem pessoal de colaboradores da Justiça é protegida pela Lei nº 12.850/2013, cabendo ao Juiz fazer valer essa preservação da imagem sempre que solicitado pelo depoente ou por sua defesa. Fato que foi anunciado pela Magistrada mais de uma vez durante a audiência.

De acordo com a Lei nº 12.850/2013: “Art. 5o São direitos do colaborador: I - usufruir das medidas de proteção previstas na legislação específica; II - ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservados; III - ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais coautores e partícipes; IV - participar das audiências sem contato visual com os outros acusados; V - não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito;....”.

E mais: “Art. 18. Revelar a identidade, fotografar ou filmar o colaborador, sem sua prévia autorização por escrito: Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.”

Diante da publicação de fotos do depoente por alguns veículos de imprensa, ali mesmo enquanto se desenvolvia a audiência, a Magistrada advertiu, por três vezes, os profissionais da imprensa presentes e solicitou a imediata retirada das imagens dos sites de noticias, o que foi atendido pela maioria dos Jornalistas presentes ao ato.

Vale ressaltar que, em nenhum momento, foi dada voz de prisão aos jornalistas ou houve cerceamento do direito de acesso à informação, ficando a situação restrita às advertências sobre o que está previsto na Lei, inclusive com a advertência sobre a possibilidade da prisão em flagrante pela publicação das imagens.

A AMAM, enquanto entidade associativa dos magistrados do Estado de Mato Grosso, sempre se pautou pela transparência e ressalta que a Magistrada da 7ª Vara Criminal não tem agido de forma diversa, pois nunca foi negado o acesso de profissionais da imprensa às audiências naquela unidade judiciária, certa de que os jornalistas se portariam de acordo com as regras da vigente legislação brasileira, até porque o direito à informação não é ilimitado, assim como não o é nenhum dos direitos ditos fundamentais.


Em apoio aos jornalistas, a OAB-MT publicou a seguinte nota:

A Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Mato Grosso (OAB-MT) repudia veementemente as ameaças sofridas por jornalistas, durante cumprimento de seu exercício profissional, em audiência de instrução e julgamento na 7º Vara Criminal de Cuiabá na tarde desta segunda-feira (12).

Conforme noticiado pela imprensa, a juíza Selma Rosane Santos Arruda ameaçou prender os jornalistas que acompanhavam a audiência caso não retirassem, no prazo de 30 segundos, fotos do interrogado publicadas nos veículos de comunicação.

A magistrada acatou o pedido da defesa para que não fossem realizadas imagens durante a audiência. Na cobertura do caso de grande repercussão social, os jornalistas registraram a chegada do interrogado, sem qualquer oposição de sua parte ou de seu advogado no ato.

Durante a audiência de instrução, a juíza constatou que as fotos feitas antes de seu início estavam publicadas nos veículos de comunicação e, assim, declarou aos jornalistas que estavam presentes, que caso as imagens não fossem retiradas dos veículos no prazo de 30 segundos, mandaria prendê-los.

Repórteres que exerciam sua função de divulgar os fatos para a sociedade chegaram a deixar o local depois da ameaça, impedindo seus leitores de acompanhar o desfecho da audiência.

É inaceitável, no momento que vivenciamos em todo o país, inclusive em que não são raros os ilegais e repudiáveis vazamentos de acordos e sigilos telefônicos em grandes operações, que os profissionais que possuem o dever de informar a sociedade tenham seus direitos intimidados e, cerceando assim, o direito do cidadão à informação.

De acordo com o artigo 3º, alínea “j”, da Lei nº 4.898/65, constitui crime de abuso de autoridade qualquer atentado aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional.

A Ordem, como advogada da sociedade, defende a observância legal dos limites de atuação, tanto por parte dos operadores do Direito, quanto dos profissionais de Comunicação.

A prisão é o instituto penal máximo deste país e, portanto, deve ser tratada com seriedade, fazendo valer para o estrito cumprimento da lei, nos casos por ela previstos e em conformidade com o processamento penal vigente neste país. Não pode, desta forma, ser banalizada como mero instituto de ameaça.


O Sindicato dos Jornalistas de Mato Grosso publicou nota:

O Sindicato dos Jornalistas de Mato Grosso (Sindjor/MT) vem a público manifestar repúdio à ameaça de prisão feita pela juíza Selma Rosane Santos Arruda, da 7ª Vara Criminal de Cuiabá, a jornalistas em exercício da profissão durante audiência de instrução e julgamento da Operação Rêmora, na tarde de segunda-feira (12 de dezembro), no Fórum de Cuiabá.

Conforme noticiado por veículos de comunicação da capital, a magistrada ameaçou prender jornalistas de sites de notícias que divulgaram imagens do interrogado no referido processo, antes do início da audiência. Após checar as imagens publicadas, a juíza declarou que, caso as fotos não fossem retiradas em ‘30 segundos’, mandaria prender os profissionais da imprensa, em tom de ameaça e de forma desrespeitosa, provocando temor nos trabalhadores.

Tal ato representa abuso de autoridade injustificável, que vem acontecendo de forma recorrente por parte de representantes do Poder Judiciário, na tentativa de direcionar o que pode ou não ser informado à sociedade. Isso não será aceito pelos profissionais da imprensa mato-grossense.

Defendemos a liberdade de expressão como princípio e prática, como pré-requisito de uma democracia múltipla e livre. Reprovamos veementemente, portanto, a atitude de pessoas que abusam do posto de autoridade civil, desrespeitam, ameaçam e impedem o trabalho da imprensa e o direito ao acesso à informação.

A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI) emitiu nota em favor dos colegas mato-grossenses:

A Abraji repudia a atitude da juíza Selma Rosane Arruda, da 7ª Vara Criminal de Cuiabá, de ameaçar jornalistas com prisão durante audiência realizada nesta segunda-feira (12.dez.2016). A magistrada exigiu que os repórteres que cobriam o depoimento de Giovani Guizardi, réu na Operação Rêmora, retirassem as imagens dos sites para os quais trabalham "em 30 segundos". Se não o fizessem, seriam presos.

Guizardi não manisfestou contrariedade a ser fotografado quando chegou ao Fórum de Cuiabá, um local público. O advogado do réu pediu que não fossem divulgadas imagens do cliente apenas durante o depoimento.

Nenhum agente público pode ameaçar jornalistas nem impedir sua atividade profissional. É inaceitável que uma juíza aja em tamanho descompasso com os direitos fundamentais pelos quais deveria zelar, como a liberdade de expressão e de informação.

* Atualizada às 14h e às 14h23.

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