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Domingo, 28 de abril de 2024

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Um Estado violento cria leis violentas: “o melhor governo é o que governa menos”

Arquivo Pessoal

"Do rio que tudo arrasta se diz que é violento. Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem." - Do poema Sobre a Violência - Bertolt Brecht

Estão querendo criminalizar os Movimentos Sociais! Querem tratar os manifestantes brasileiros como vândalos, criminosos, terroristas e assassinos. Protestante vai virar terrorista em nova lei Federal. 30 anos de cadeia. E ainda essa corja de políticos chamam nossos jovens de violentos... O estado te violenta a vida inteira e depois cria a Lei do Silêncio onde protestante será tratado como terrorista. O AI 5 da democracia.



O que é violência? Quem é violento?

Violento é o estado que nos violenta!

Um país violentamente pacífico desde sua fundação enquanto nação. Nossa violência veio de Portugal, violentaram milhares de índias e mataram milhares de índios. Violentaram com a cruz e com a espada. Derrubaram violentamente quase toda nossa Mata Atlântica. Com garimpos e mercúrio, violentaram nossos rios. Violentam com chicotes os negros desde os tempos de Cabral. 500 anos de violências desde Portugal.

Violência é (ainda) estarmos discutindo a demarcação das terras indígenas em pleno século 21. Violência é ver que o Brasil não é mais dos Brasis. Violência é sermos um país continental ainda sem Reforma Agrária, tão necessária. Violência é a bancada Ruralista mudar o Código Florestal. Violento é o Brasil se tornar a 5ª maior economia global com quase a pior distribuição de renda mundial. Violência é a riqueza concentrada nas mãos das 85 pessoas mais ricas do mundo equivaler aos recursos da metade mais pobre da população mundial.

Violência é ser o país campeão em exportação de grãos e ainda ter centenas de milhares de crianças passando fome todos os dias.

Violência é termos um mar de soja onde antes era rico em cerrado e biodiversidade. Violentas são nossas estradas mal conservadas. Violência é político asfaltar as estradas de suas fazendas com dinheiro público. Violência é ter que pagar pedágio. Violento é o político legisla em causa própria. Violento é um político que está na ativa com mais de 100 processos sem condenação. Violência é vermos os familiares desses políticos mafiosos substituí-los na liderança dessas quadrilhas. Violência são as obras da Copa (superfaturadas, mal feitas e não acabadas). Violento é ter políticos ligados com João Arcanjo e Fernandinho Beira Mar.

Violência é construir estádios em um país que faltam escolas e hospitais. Violência é ouvir Pelé e Ronaldo falar de educação e saúde em tempos de Copa do Mundo. Violenta é nossa política de esporte que não investe no atleta desde criança. Violência é ter milhões de jogadores ganhando salários de fome enquanto alguns poucos iluminados ganham fortunas astronômicas. Violência é o Museu do Índio na Aldeia Maracanã virar estacionamento do Eike Batista.

Violência é ter que trabalhar quase 5 meses por ano só para pagar impostos. Violência são nossos mais de 80 tributos existentes. Violência é termos um dos políticos mais caros do mundo. Violência é termos os políticos mais corruptos do mundo. Violência é ser um dos países que pior devolve aquilo que pega do contribuinte. Violência é ter que votar obrigatoriamente. Violência é o financiamento privado de campanha. Violência são nossas facções partidárias.

Violência é professor protestar e lutar por valorização salarial e tomar borrachada de PMs nas ruas. Violência é o Brasil ocupar o 58º lugar em matemática, o 55º lugar em leitura e o 59º lugar em ciências em um ranking de 65 países no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa) 2012. Violência ver isso e não destinar 10% do PIB para educação. Violência é sermos ainda um país com milhões de analfabetos. Violência é pagar educação particular. Violência é pagar um piso indecente de mil e poucos reais aos professores. Violência é ter a 8ª maior população de analfabetos adultos num total de 150 países avaliados pela ONU. De acordo com a mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2012 e divulgada em setembro de 2013, a taxa de analfabetismo de pessoas de 15 anos ou mais foi estimada em 8,7%, o que corresponde a 13,2 milhões de analfabetos no país.

Violento é o estado que dá uma farda, uma arma e um distintivo para o soldado e depois paga-lhe dois contos por mês e ainda quer exigir honestidade. Violência é o policial despreparado e mal remunerado. Violento é um policial te pedir suborno e ainda te dar lição de moral. Violenta é nossa atual política fracassada de combate às drogas. Violência são as 10 mil mortes decorrentes de autos de resistência e de desaparecimentos no RJ só nos últimos 10 anos (2001 a 2011). Segundo o sociólogo Michel Misse, a polícia fluminense mata mais do que a de muitos países. Nos Estados Unidos, onde a polícia é conhecida pela truculência, são mortos anualmente em confronto uma média de 300 pessoas para uma população de aproximadamente 314 milhões (uma morte para cada 1.050.000 pessoas). Já no Rio de Janeiro são mil mortes para 16 milhões de habitantes (uma morte para cada 16.000 pessoas). Misse afirma que nem mesmo em outros países latino-americanos com violento histórico de guerras civis e tráfico de drogas, como Colômbia e México, isso ocorre. Para o sociólogo, a falta de indignação da sociedade frente a esse quadro causa tanta preocupação quanto os próprios dados.



Violento é o negro que acorrentaram pelo pescoço e despiram em praça pública?

Violência é a cor, idade e a classe social de nosso racismo. Violenta é uma classe média que defende a tese de que “bandido bom é bandido morto”. Os justiceiros não prendem e matam os bandidos de colarinho branco. Violência é o filho do Eike Batista matar e ser absolvido. Violência é Paulo Maluf não estar preso. Violência é deputado Natan Donadon continuar no cargo mesmo de dentro da cela. Violência é ver o filho pobre do Lula se tornar milionário da noite para o dia com sua empresa de telefonia. Violência também são as privatizações do FHC. Violento é o preço do combustível da Petrobrás. Violento é o preço de nosso gás. Violência é a Dilma criticar e também privatizar.

Violência é Belo Monte. No Brasil violência tem de monte. Violência é construir uma hidrovia no Rio Paraguai. Violência é nosso transporte público. Violentas são nossas empresas de telefonia. Violência é você ligar para o 0800.

Violência é assistir o telejornal todos os dias. Violência é nossa imprensa e as concessões de rádio e TV que estão nas mãos de meia dúzia de famílias que controlam nossa informação desde a ditadura. Violentas são as novelas da Rede Globo. Violência são os textos da revista Veja. Violência é como tratam gays, lésbicas e transexuais nesse país. Violência é ouvir políticos como Marco Feliciano e Jair Bolsonaro.

Violento é o secretário de saúde corrupto. Violência é você precisar ser atendido pelo SUS. Violência é ter que pagar plano de saúde particular. Violência é alguém viver com apenas 1 salário mínimo e não poder nem adoecer. Violência é teu avô de 89 anos por horas esperando ser atendido em uma fila do Pronto Atendimento de Saúde. Violência é a falta de UTI, de médicos e de remédios. Violento é nosso modelo hospitalocêntrico de tratar nossas doenças. Violentos são os grandes laboratórios químicos que além de contaminarem seu alimento no campo e depois vendem produtos para curar o câncer. Violência é a mulher ser obrigada a parir o filho de um estuprador.

Vandalismo é quebrar a vidraça de um banco?

Digo que violência é ser cliente de banco.

Violento é o dono do Banco!

Bertolt Brecht já questionava isso lá no século 19:

“O que é roubar um banco comparado a fundar um?”

Somos muito pacíficos com esse estado de coisas, não acham?

Os políticos corruptos estão preocupados com as manifestações durante a Copa do Mundo.

É que na verdade eles já sabem, se houver revolução, irão faltar guilhotinas!

A famosa frase "o melhor governo é o que governa menos" abre o livro "A Desobediência Civil", escrito no século 19 por Henry David Thoreau (1817-1862): "O melhor governo é o que governa menos" - aceito entusiasticamente esta divisa e gostaria de vê-la posta em prática de modo mais rápido e sistemático.
Uma vez alcançada, ela finalmente equivale a esta outra, em que também acredito: 

"O melhor governo é o que absolutamente não governa"

E quando os homens estiverem preparados para ele, será o tipo de governo que terão.
Na melhor das hipóteses, o governo não é mais do que uma conveniência, embora a maior parte deles seja, normalmente, inconveniente - e, por vezes, todos os governos o são. As objeções levantadas contra a existência de um exército permanente - e elas são muitas e fortes e merecem prevalecer - podem afinal ser levantadas também contra a existência de um governo permanente. O exército permanente é apenas um braço do governo permanente.

O governo em si, que é apenas a maneira escolhida pelo povo para executar sua vontade, está igualmente sujeito ao abuso e à perversão antes que o povo possa agir por meio dele. Basta pensar na atual guerra mexicana, obra de uns poucos indivíduos que usam o governo permanente como seu instrumento, pois, de início, o povo não teria consentido nesta medida.

Vídeo indicado: Poema Provocações de Luis Fernando Veríssimo




*Reinaldo Marchesi - É professor universitário, mestre em Educação pela UFMT (linha: Cultura, Memória e Teoria em Educação). Pesquisa no campo da Filosofia da Educação. Leitor de Nietzsche, Foucault, Deleuze e Derrida [Os malditos da filosofia]. Escreve todas às sextas-feiras na coluna Filosofia de Boteco.

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