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Segunda-feira, 29 de abril de 2024

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escrever é desejo? amor? dor?

O que faz um escritor ser um escritor? Os próprios tentam responder a esta indagação

Foto: Reprodução

O que faz um escritor ser um escritor? Os próprios tentam responder a esta indagação
“Escrevo para satisfazer um desejo”, disse Barthes. O que nos traz ao questionamento: o que leva alguém a enredar pelo caminho das letras? O que leva alguém a depositar todo o seu coração em letras e palavras? O que leva alguém a fazer deste o seu labor diário? É difícil definir. Para alguns é uma busca incessante de preencher um vazio, ou pode ser o encontro da dor com as páginas em branco, a revolta, o desamor, a desilusão. São tantos motivos para se começar a escrever. Mas a escrita é sempre um esvaziar para preencher, e então voltar ao vazio. Assim está selado o ciclo vicioso da escrita, pois, o autor sempre se enche para voltar a se esvaziar.

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Mas, para entender o que levam os escritores a se renderem às idéias e palavras, o melhor é entender por eles mesmos, o que há por trás da literatura para prender tantos corações e dores lancinantes.

Barthes descreve a escrita como a satisfação de um desejo, que tem origem no prazer: ‘no sentimento de felicidade, júbilo, que me dá a leitura de certos textos escritos por outros’, disse Roland Barthes em 1980.

Para nossa Clarice Lispector, o resultado fatal de viver é o ato de escrever. ‘Eu escrevo para nada e para ninguém. Se alguém me ler será por conta própria e auto-risco. Eu não faço literatura; eu apenas vivo ao correr do tempo. O resultado fatal de eu viver é o ato de escrever”, afirmou a escritora.



Outro escritor brasileiro, Rubem Alves define a escrita e a leitura como formas de fazer amor, para produzir prazer. “É por isso que os amores pobres em literatura ou são de vida curta ou são de vida longa e tediosa”, acrescenta sobre a ideia de se fazer amor na escrita.

Fernando Pessoa é um dos maiores poetas do mundo, para além-mar de Portugal suas palavras ganharam o mundo. Em um poema chamado “Isto”, Pessoa descreve o que é e porque escrever.

“Dizem que finjo ou minto/ Tudo que escrevo/ Não/ Eu simplesmente sinto/ Com a imaginação/ Não uso o coração/ Tudo o que sonho ou passo/ O que me falha ou finda/ É como que um terraço/ Sobre outra coisa ainda/ Essa coisa é que é linda/ Por isso escrevo em meio/ Do que não está ao pé/ Livre do meu enleio/ Sério do que não é/ Sentir, sinta quem lê!”, poema “Isto” de Fernando Pessoa.



Mas, de todas as visões românticas sobre a escrita, ainda há escritores como o beatnik Charles Bukowski, que dilacera a realidade para trazer uma escrita caótica, urbana, cuja intenção é nocautear o leitor para que junto com o escritor, possa vomitar a voracidade da vida. E então, com a palavra, o poema “Como ser um grande escritor” de Bukowski, que dá a a fórmula para se tornar basicamente, como ele, o maldito entre os benditos.

"você tem que trepar com um grande número de mulheres
belas mulheres
e escrever uns poucos e decentes poemas de amor.

não se preocupe com a idade
e/ou com os talentos frescos e recém-chegados;

apenas beba mais cerveja
mais e mais cerveja

e vá às corridas pelo menos uma vez por
semana

e vença
se possível.

aprender a vencer é difícil -
qualquer frouxo pode ser um bom perdedor.

e não se esqueça do Brahms
e do Bach e também da sua
cerveja.

não exagere no exercício.

durma até o meio-dia.

evite cartões de crédito
ou pagar qualquer conta
no prazo.

lembre-se que nenhum rabo no mundo
vale mais do que 50 pratas
(em 1977).

e se você tem a capacidade de amar
ame primeiro a si mesmo
mas esteja sempre alerta para a possibilidade de uma derrota total
mesmo que a razão para esta derrota
pareça certa ou errada

um gosto precoce da morte não é necessariamente uma cosa má.

fique longe de igrejas e bares e museus,
e como a aranha seja
paciente
o tempo é a cruz de todos
mais o
exílio
a derrota
a traição

todo este esgoto.

fique com a cerveja.

a cerveja é o sangue contínuo.

uma amante contínua.

arranje uma grande máquina de escrever
e assim como os passos que sobem e descem
do lado de fora de sua janela

bata na máquina
bata forte

faça disso um combate de pesos pesados

faça como o touro no momento do primeiro ataque

e lembre dos velhos cães
que brigavam tão bem
Hemingway, Céline, Dostoiévski, Hamsun.

se você pensa que eles não ficaram loucos
em quartos apertados
assim como este em que agora você está

sem mulheres
sem comida
sem esperança

então você não está pronto.

beba mais cerveja.
há tempo.
e se não há
está tudo certo
também" 


Charles Bukowski


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