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Domingo, 12 de maio de 2024

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DESCONFORTO

Juiz classifica promotor de 'chicaneiro' e expõe crise com MPE

Foto: Reprodução

Juiz classifica promotor de 'chicaneiro' e expõe crise com MPE
A crise entre o Judiciário e Ministério Público Estadual (MPE) ficou explícita na briga pelo julgamento da ação popular contra o major Eumar Novacki, ex-secretário de Comunicação e da Casa Civil da gestão Blairo Maggi (PR).


Na decisão, em que rejeita o pedido de Exceção de Suspeição, impetrado pelo MPE pedindo que não julgue o caso, o juiz Roberto Teixeira Seror classifica o promotor da Fazenda Pública Gustavo Ferraz de "chicaneiro", que conforme o dicionário significa "trapaceiro".

O MPE, por sua vez, tendo o pedido negado, impetrou mandado de segurança para garantir o afastamento do juiz do caso de Novacki. O problema foi parar no Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) e, após vários sorteios, o processo encontra-se com o desembargador José Tadeu Cury. Não se sabe exatamente a quem falta isenção no caso, diante de tantas rusgas – se ao juiz, se ao promotor.

O desconforto público entre os Poderes começou numa ação popular contra o ex-secretário. Após a tramitação normal do processo, o MPE requereu o julgamento antecipado da lide, isto é, uma forma de acelerar a sentença.

No entanto, às vésperas da posse do senador Blairo Maggi (PR), o mesmo órgão que havia pedido formalmente o julgamento rápido retirou o processo das mãos do Judiciário, não o deixando julgar.

Tomando conhecimento do estranho fato, o juiz determinou a um encarregado que comunicasse ao promotor Gustavo Dantas Ferraz que devolvesse o processo e este respondeu que só o faria mediante ordem judicial. De imediato, o juiz Seror determinou a busca e apreensão dos autos, por meio de oficial de Justiça designado.

O imbróglio não acabou aí. O oficial tentou notificar o Gustavo Ferraz que não atendia ao telefone e nem se encontrava no Ministério Público. Diante da recusa, certificou formalmente ao juiz que a ordem não poderia ser cumprida, solicitando uso de reforço policial. Após o mal estar já causado, somente então o promotor entregou o processo, ingressando com uma Exceção de Suspeição contra o magistrado.

Por falta de fundamento, o juiz indeferiu a representação e, em seguida, o Ministério Público, inconformado, impetrou o mandado de segurança no TJMT que, após idas e vindas, parou na mão do desembargador José Tadeu Cury.

O problema agora é averiguar se é cabível o mandado de segurança, uma vez que havia recurso da decisão do magistrado de primeira instância. Geralmente, quando há recurso previsto nos códigos, não se pode ingressar com um mandado de segurança que é uma ação mais rápida e de conhecimento superficial. Seria uma forma de burlar o procedimento previsto na legislação civil.

Confira abaixo a íntegra da decisão do juiz Seror:

O Juiz de Direito Josemar Dias Cerqueira, em feliz artigo denominado de “A Suspeição é uma exceção, não uma regra” corrobora com tal entendimento, consignando que:
“Um jornal local publicou recentemente uma reportagem sobre um Prefeito, cujo trecho relatava:"Ele tem vencido todas as batalhas, até agora, com a ajuda da justiça e da sorte. Da justiça, porque ele encontrou uma brecha e argüiu a suspeição do juiz [...]"

Exemplos com este comprovam que precisa ser revisto o tratamento processual dado à arguição de exceção baseada na suspeição ou impedimento. O ponto principal da questão está no rito adotado pelo CPC: Art. 306 - Recebida a exceção, o processo ficará suspenso (art. 265, III), até que seja definitivamente julgada.

Da determinação legal origina-se o expediente adotado de forma minoritária, mas ainda assim preocupante, por certos advogados, quando objetivam protelar o andamento da causa: sustentar a suspeição do julgador.

Nesta seara encontra-se de tudo como justificativa a se questionar a imparcialidade do julgador: um requisito anterior indeferido, uma outra causa foi infrutífera, a parte adversa já obteve sucesso em outro processo, o requerente já foi advertido nos autos, etc.. Dentre tantos, destaque-se um caso narrado por um advogado.

Um Prefeito, com várias pendências judiciais, dentre elas, uma lide em que o pedido
do seu afastamento estava pendente de decisão judicial, enviou certa quantidade de flores à magistrada da causa. A juíza, preocupada com a repercussão do fato e com o clima de tensão no Município, optou por devolver o adorno, repleto de cálices, corolas, androceus e gineceus, à floricultura, causando a impetração da exceção de suspeição.

Superados os casos de indeferimento inicial, uma observação das estatísticas mostrarão que as exceções de suspeição são julgadas improcedentes, em sua quase totalidade. O baixo número de procedência das exceções advém da formação do magistrado, talhado para exercer uma função relevante e com o preparo técnico e moral pertinente, mantendo-se distante da lide e cônscio de seu papel no processo e na comunidade.

O juiz que não percebe que não pode judicar nos autos faz parte de uma minoria, tal
fato só acontecendo, de regra, por descuido que a todos acomete eventualmente. O magistrado que é ciente da impossibilidade e persiste no processo, insere-se nos traços das estatísticas, tornando-se a exceção, sem trocadilho, que justifica a existência do instituto, não podendo este pequeno quantitativo servir para justificar a regra geral da suspensão do curso processual, em detrimento da normalidade que é o julgador imparcial.

Notam-se, portanto, três aspectos negativos no tratamento jurídico que atualmente é dado à matéria: engessamento da atuação do magistrado atacado, falta de contraditório e suspensão automática do processo.

A análise da suspeição parece fugir de qualquer apreciação pelo juiz indigitado, posicionamento que tem acolhida em doutrinadores de escola, inclusive baseados no fato de que a opção de indeferimento da petição inicial foi dada apenas na exceção de incompetência, conforme art. 310 do CPC, além de que o julgamento é sempre
mencionado como realizado pelo Tribunal (arts. 313 e 314 do CPC).

Não se pode deixar de observar que o legislador menciona no art. 306 a expressão "recebida a suspensão", sinalizando a possibilidade de que ela pode não ser recebida, ainda que não haja disposição semelhante à do art. 310 do CPC. Defende-se, há algum tempo, a possibilidade do próprio magistrado imputado como suspeito indeferir a inicial, quando manifestamente fora de propósito. Não é o caso do magistrado atacado adentrar no mérito da ponderação dos argumentos apontados, sopesando sua adequação aos casos previstos na legislação, pois esta é tarefa do Tribunal.

Sustenta-se, sim, que existem pressupostos formais à admissão da medida extrema no mundo jurídico. A razão está nos princípios que regem a atuação do magistrado, além da própria regulamentação técnica quanto às petições dos autos, prevista, dentre outros, no art. 282 do CPC, sem falar nas causas de extinção do art. 267, IV e VI do CPC, aplicáveis ao incidente por similitude.

Imagine-se um caso absurdo: "A" ajuíza uma ação contra "B", sendo este citado. No prazo de contestação, "C" interpõe uma exceção de suspeição. Deverá ser ela causa de suspensão do processo?. Sendo "C" estranho à lide, falece-lhe condição para excepcionar o julgador. Se "C" é pretenso terceiro interessado e o instituto fala em "parte", sua condição haverá de se aprovada, para só depois ser admitido no feito sob decisão judicial. Outra situação: a parte aponta um impedimento baseado no fato de que "o magistrado teria peticionado no feito como patrono da parte adversa, conforme
demonstram as fls. tais e tais dos autos", sendo que se trata de um patrono homônimo do julgador, fato público e notório. O absurdo é flagrante, não sendo crível que se aplique a suspensão simples e pura do andamento do processo. Em ambos os casos, a suspeição deverá ser indeferida de pronto.

O mestre Humberto Theodoro Jr. aborda o assunto: "[...] Quando, porém, ocorrer objetivamente o descabimento da exceção (por intempestividade ou invocação de fato que, à evidência, não esteja entre os previstos nos arts. 134 e 135 do CPC), poderá o próprio juiz denegá-la liminarmente [...]"

Existem manifestações judiciais no mesmo sentido, sendo que alguns admitem, inclusive, interpretação extensiva da norma do art. 310 do CPC.

Atente-se que a possibilidade de apreciação da suspeição pelo próprio imputado não é matéria estranha em nosso ordenamento, conforme dispõe, por exemplo, o art. 653 da CLT, ao tratar das exceções de membros das antigas juntas de conciliação e julgamento, e o processo administrativo, no âmbito da Administração Pública Federal (arts. 20 e 21 da Lei 9.784 de 29.01.99).

O Código de Processo Penal trata de forma distinta a matéria:

Art. 102 - Quando a parte contrária reconhecer a procedência da argüição, poderá ser sustado, a seu requerimento, o processo principal, até que se julgue o incidente da suspeição.

Art. 111 - As exceções serão processadas em autos apartados e não suspenderão, em regra, o andamento da ação penal. Um aspecto a destacar no dispositivo criminal é que traz a parte adversa para a discussão da exceção, privilegiando o princípio constitucional do contraditório. Mesmo sendo o incidente voltado contra o julgador, há interesse da outra parte, até mesmo para secundar um dos pólos, trazendo novos elementos à questão, que poderá repercutir na apreciação do incidente, como, por exemplo, uma conduta semelhante do excipiente com outros julgadores.

A disparidade do tratamento salta aos olhos: um juiz sob o manto da suspeição pode continuar a atuar no processo e privar alguém de seu bem maior - a liberdade- na pendência de uma exceção de suspeição, mas um juiz apontado como suspeito não pode apreciar o despejo de um cidadão.

A suspensão automática pode, inclusive, comprometer o deslinde da causa, se há necessidade de prova imediata ou risco de ineficácia da medida pleiteada, após decurso de certo tempo. Exemplo do cotidiano: proposto um divórcio litigioso em comarca de vara única, onde os filhos estão com a genitora, o julgador determina a citação do réu. Contrariado pelo ajuizamento, o genitor retira os filhos da posse da esposa e inicia processo de dilapidação de patrimônio, havendo indícios suficientes de viagem para lugar desconhecido com os menores, interpondo, simultaneamente, exceção de suspeição do magistrado por motivo qualquer. Não se pode requerer busca e apreensão? Não serão seqüestrados os bens? Há decisões em
sentido afirmativo.

O rito precisa ser modificado, para que a suspensão aconteça, em primeiro momento, por decisão do magistrado imputado, quer de ofício, quer por provocação. Dir-se-á que agora o excipiente é que fica ao alvedrio do magistrado suspeito. Em primeiro lugar, tal fato justifica-se pela situação de escassez da parcialidade do julgador, como já abordado anteriormente: o número de exceções reconhecidas pelo excipiente é ínfimo e menor ainda aquelas reconhecidas pelos Tribunais, quando o magistrado nega a parcialidade ou impedimento. Em segundo lugar, a parte pode buscar o resguardo da decisão na instância superior, pugnando pelo efeito suspensivo do agravo (art. 527 do CPC).

Em terceiro lugar, a parte excipiente já corre riscos na disciplina processual atual. Existem, na realidade, três hipóteses possíveis em casos de parcialidade do julgador. A situação majoritária é a do juiz que na primeira vez em que aprecia o processo percebe a situação que mitiga sua parcialidade e, de ofício, nos termos do artigo 49, II da LOMAM, reconhece a impossibilidade de sua continuação no feito, sendo desnecessária a exceção. Em segundo lugar, surge a escassa situação do magistrado que atenta para a possibilidade após a manifestação do excipiente. Neste caso, o magistrado reconhecerá o alegado, determinando a remessa dos autos prevista no artigo 313 do Código de Processo Civil.

Em último lugar, tem-se a exígua parcela de casos em que o magistrado recusa a argüição de parcialidade, exigindo manifestação da instância superior para dirimir a questão. Nos termos da solução proposta, o processo não seria suspenso, de regra, enquanto se aguarda o julgamento deste incidente.

Poderá se afirmar que a parte que alegou a suspeição poderia sofrer danos significativos, naqueles casos que só podem ser ponderados no exercício da discussão científica, em que o magistrado deliberadamente visaria o prejuízo da parte excipiente. A segurança que os defensores deste ponto de vista encontram no referido dispositivo suspensivo inexiste na realidade. Encontram-se, tanto naqueles poderes explicitados no Código de Processo Civil, quanto nos princípios norteadores da hermenêutica processual, possibilidades bem maiores de prejuízo à parte, se for esta a intenção de um condutor parcial do processo. Além dos nominados poderes do juiz, o magistrado pode, por exemplo, conceder a tutela antecipada do pedido ou determinar medidas para efetivação da sentença, mesmo de ofício, sem falar no poder geral de cautela, alterando situações jurídicas até sem citação da parte adversa.

Pergunta-se, portanto: a parte está protegida de um magistrado suspeito pela simples previsão da suspensão do processo após a arguição da exceção? Dito de outra forma, apenas para exercício científico: se for ajuizada uma ação cautelar contra um reconhecido inimigo de um magistrado, e este quiser prejudicar o réu, poderá conceder uma liminar antes mesmo do requerido ser citado, para que pudesse argüir
a suspeição. Por quê, então, se constrói um rito procedimental com paralisação obrigatória, fundado nesta última situação (mácula na imparcialidade do julgador), causando uma suspensão genérica do processo, quando a quase totalidade das exceções resulta na improcedência do pedido?

O que se defende, devo apontar, não é exatamente novo, guardando forte semelhança com o que dispõe o regimento do STF. Os magistrados são forjados na  imparcialidade, sendo treinados para seu exercício; são selecionados em processos rigorosos, que geram o grande número de vagas disponíveis pelo País afora. É da natureza do juiz acolher qualquer alegação plausível de risco à sua imparcialidade, em prol da lisura do processo, mas é também seu dever defender o exercício da sua jurisdição naqueles casos em que a parcialidade só encontra eco no vácuo de moralidade de alguns, sendo injusto, no sentido laico e no sentido técnico, a suspensão do processo como regra na exceção de suspeição e impedimento.

A medida não é correta, não é técnica e não condiz com a função do julgador, invertendo a presunção constitucional de inocência dada até aos acusados confessos na seara criminal.

De resto, a disciplina atual é inócua para os fins a que se destina, propiciando eventuais chicanas, via de regra retardando desnecessariamente o processo e aumentando o sentimento de lentidão na prestação jurisdicional.”

(CERQUEIRA, Josemar Dias. A suspeição é uma exceção, não uma regra. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 459, 9 out. 2004).
 
Volvendo-se à celeuma em questão, os seguintes vícios impedem o recebimento desta exceção: 1) não fora indicada qual parte seria supostamente favorecida por este Magistrado, nem mesmo em que consistiria tal favorecimento; 2) a exceção foi interposta manifestamente fora do prazo, já que este Julgador já havia funcionado outras vezes no feito e o Ministério Público não o excepcionou quando de sua primeira manifestação; 3) está identificada, pela conduta do Promotor excipiente, a má-fé na
utilização do instrumento para tentar procrastinar o feito e escolher o julgador.

Impende, pois, a rejeição liminar desta exceção. Nesse sentido, são os ensinamentos abaixo: “A apreciação e julgamento do incidente tocam ao Tribunal Superior a que se acha subordinado o juiz impugnado. Quando, porém, ocorrer objetivamente o descabimento da exceção (por intempestividade ou invocação de fato que, à evidência, não esteja entre os previstos nos arts. 134 e 135 do CPC), poderá o próprio Juiz exceto denegá-la liminarmente, dentro do dever legal que lhe toca de ´velar pela rápida solução do litígio´ e de ´prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da
Justiça´(art. 125, II e III)”. Destacamos (Theodoro Jr., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol I. 25ª Ed.. Pág. 386. – Rio de Janeiro: Forense)

Nesse sentido, também, já se manifestaram os Tribunais Pátrios, vejamos: Assim, visando o juiz não apenas fazer-se justiça, mas também impor rapidez ao término do processo é possível, excepcionalmente, indeferir de plano exceção de suspeição proposta contra ele." (2º TACv- SP MS 439.555-9ª Câm. - Rel. Juiz EROS PICELI - J. 13.9.95)

O artigo 310 do CPC autoriza a rejeição liminar também da exceção de suspeição, com vistas ao seu conteúdo, quando manifestamente improcedente.( Agravo 159344. 8ª Câmara do 2º TAC/SP. Rel. Juiz Garreta Prats, JB 119, Ed. Juruá, p.112 POSTO ISTO, consoante a fundamentação acima, com base no art. 313 c/c art. 310, ambos do Código de Processo Civil, REJEITO LIMINARMENTE esta exceção de suspeição oposta manifestamente intempestiva (preclusão ) e descabida ( chicana forense ).

Deixo de aplicar multa processual ao douto Promotor por razões humanitárias. Desapense e em seguida, intime-se o excipiente com urgência. Façam os autos principais cls. com urgência, conforme desde o início já havia determinado, para exame.

Cumpra-se.
Cuiabá, 04 de fevereiro de 2011.

ROBERTO TEIXEIRA SEROR
JUIZ EXCEPTO
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