Olhar Direto

Segunda-feira, 29 de abril de 2024

Opinião

O inimigo do povo

O povo brasileiro tem um inimigo. Cruel, solerte, assassino. Mata mulheres e homens; idosos e bebês; negros  e brancos; religiosos e ateus; doutores e iletrados; progressistas, liberais ou direitistas.

Com absoluta certeza, o leitor amigo conhece uma de suas vítimas, pois elas somam centenas de milhares anualmente em nosso país. Foi um familiar, um amigo, um vizinho, um colega de trabalho, alguém próximo ou distante que partiu precocemente e com sofrimento desnecessário.

É um inimigo que não se esconde. Quase todos o reconhecem e sabem de sua letalidade.
Ainda assim, atua impunemente há muitas décadas. Seus negócios são considerados respeitáveis e seus representantes são recebidos com pompas nas diversas instâncias de poder. Os que ousam denunciá-lo e contrariá-lo são alvo de campanhas visando o seu descrédito.

Sim, meus caros, refiro-me ao tabagismo.

Cerca de 500 brasileiros morrem todos os dias em razão de doenças provocadas pelo tabagismo, como câncer de pulmão, enfisema e outras enfermidades respiratórias e cardíacas.
Todos os dias. Há décadas.

O tabagismo mata, inclusive, não-fumantes, em escala de 1 milhão de vítimas, anualmente, em todo o mundo, segundo a Organização Pan-Americana de Saúde.

Mesmo os que sobrevivem ao tabagismo têm a sua saúde comprometida e prejudicada a qualidade de vida de suas famílias.

O tabagismo provoca prejuízo de dezenas de bilhões de reais às empresas privadas e aos cofres públicas em decorrência de custos com o sistema de saúde, ausências, licenças e perda de produtividade. E isso só continua assim porque há um pequeno grupo de empresas que lucram muitos bilhões com a morte, o sofrimento e a destruição.

Ao longo dos anos, um paciente trabalho de esclarecimento e conscientização levou à redução da proporção de fumantes no Brasil, que é maior entre os de menor escolaridade.

A bilionária indústria da morte reagiu desenvolvendo uma nova modalidade de dependência química: os cigarros eletrônicos e vaporizadores, nos quais são introduzidos aromas agradáveis como menta para camuflar o gosto da nicotina e das demais substâncias tóxicas presentes no tabaco. Um maciço e diabólico investimento em imagem logrou popularizar tais dispositivos entre adolescentes e jovens, cujo consumo voltou a aumentar nos últimos anos.

O terrível é que, ao contrário da lenda, a utilização de cigarros eletrônicos e vaporizadores não reduz a dependência nem evita o surgimento de doenças. No entanto, o projeto de lei 6.387/2019 que, entre outras medidas, veda a adição de aromas e sabores ao tabaco, está há três anos aguardando um parecer numa comissão da Câmara dos Deputados.

O ápice do cinismo é que as megaempresas que lucram com o morticínio e o sofrimento de milhões de brasileiros ostentam nas suas páginas na internet palavras como integridade, responsabilidade social, sustentabilidade etc.

Como já argumentei em outras oportunidades, são falaciosos todos os argumentos econômicos em defesa da indústria da morte. Os pequenos produtores de tabaco, hoje submetidos às leoninas condições ditadas pelas multinacionais do setor, podem ser orientados a utilizar as suas terras para a produção de alimentos saudáveis e de maior valor agregado. É falacioso também arguir um sacrossanto direito individual ao uso do tabaco, uma vez que, como demonstrado em múltiplos estudos, são gigantescos os danos que o consumo provoca para outras pessoas e a coletividade.

É urgente e necessário enfrentar a indústria da morte e derrotar o inimigo do povo.


Luiz Henrique Lima é professor e Auditor Substituto de Conselheiro do TCE-MT.
 
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