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Sábado, 01 de junho de 2024

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Vinte anos após libertação de Mandela, África do Sul vive apartheid de classes

O líder sul-africano Nelson Mandela, que há exatos 20 anos foi libertado da prisão depois de quase três décadas encarcerado, tinha o sonho de ver seu país livre do odioso regime denominado apartheid (separação, em africânder).

O líder sul-africano Nelson Mandela, que há exatos 20 anos foi libertado da prisão depois de quase três décadas encarcerado, tinha o sonho de ver seu país livre do odioso regime denominado apartheid (separação, em africânder).


Instalado em 1948, o apartheid transformou o preconceito racial em lei na África do Sul. Negros não podiam frequentar locais exclusivos de brancos. A minoria branca tomava conta dos negócios e tinha acesso aos melhores empregos. Propriedades eram confiscadas em favor de brancos. Negros eram removidos de suas terras e forçados a trabalhar em condições desumanas.

O sonho de Mandela começou a se realizar parcialmente em 1990, quando o apartheid foi oficialmente abolido após uma difícil campanha liderada pelo presidente branco Frederik Willem de Klerk. Em 1994, nas primeiras eleições livres da África do Sul, o próprio Mandela foi eleito presidente.

O fim oficial do regime, no entanto, não livrou completamente o país do preconceito e da desigualdade. Hoje, o país vive uma separação de outro tipo, baseada na discriminação de classes econômicas.

No ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da ONU, a África do Sul ocupa a 129ª posição (o Brasil está em 75º). Segundo um recente relatório do governo, a renda mensal média dos negros aumentou 37,3% desde 1994. No caso dos brancos, entretanto, o aumento foi de 83,5%. Pelo menos 1,5 milhão de famílias vivem em favelas e um quarto dos homens adultos sul-africanos têm Aids. Apesar do surgimento de uma classe média negra, beneficiada pelas políticas de cotas, a maioria ainda vive em situação de extrema pobreza.

Para Lucien Van Der Walt, professor da Universidade de Witwatersrand, em Johannesburgo, o legado de Nelson Mandela nesse sentido é contraditório:

- Mandela foi um dos responsáveis por acabar com o apartheid, mas o governo dele falhou em aplicar a igualdade também na economia, o que só ressaltou as diferenças entre os brancos, que controlam as empresas, e os negros, que ainda lutam para ter acesso a bons empregos.

Segundo Patrick Bond, da Universidade de KwaZulu-Natal, em Durban, os governos do Congresso Nacional Africano, partido de Mandela que está no poder desde 1994, não foram capazes de reverter a herança do apartheid, apesar das políticas de acesso a empregos e distribuição de renda:

- Ao contrário do que vem acontecendo no Brasil, por exemplo, as medidas de bem-estar social do governo não tiveram muito efeito para reduzir a desigualdade na África do Sul. O país passou de um apartheid racial legalizado para um apartheid de classes, e é óbvio que os dois estão muito ligados.

Para Leila Hernandez, professora de história da África na USP, embora o fator econômico seja importante, a própria herança cultural do racismo sul-africano ainda é um dos maiores obstáculos a serem superados.

- Ainda hoje há critérios culturais que bloqueiam a entrada de negros em determinados lugares, como casas noturnas e restaurantes, sobretudo na Cidade do Cabo. Em algumas escolas, na hora do lanche, as crianças brancas fazem brincadeiras separadas das negras. Isso não pode ser atribuído exclusivamente às diferenças econômicas.

Copa do Mundo é "campanha de marketing"

Em 1995, a Copa do Mundo de Rugby, realizada na África do Sul, serviu para unir negros e brancos em torno do objetivo de conquistar o título. A história, retratada no filme Invictus - com Morgan Freeman no papel de Mandela e que estreou no Brasil no mês passado -, tem poucas semelhanças com a Copa do Mundo de 2010, que também acontecerá no país.

Para os especialistas ouvidos pelo R7, a Copa do Mundo da Fifa terá os efeitos de uma grande campanha de marketing, mas trará poucos benefícios práticos para a população. Na opinião do professor Patrick Bond, os bilhões de dólares gastos na construção de estádios poderiam ter sido mais bem aplicados:

— Em 1995 houve pelo menos um benefício psicológico, de certa união do país. Já a Copa de 2010 terá como resultado apenas uma entrada esporádica de dinheiro e, no fim, deixará grandes elefantes brancos, estádios a que a maioria da população nunca terá acesso.

Embora menos crítico, Van der Walt diz que os riscos de um investimento desse calibre são altos:

- A Copa do Mundo é "branding" (construção de marca), é o país tentando se projetar para fora. Os gastos foram muito grandes e, se essa campanha não atrair investimentos de verdade, será muito ruim e poderá gerar muita revolta.

Segundo o governo da África do Sul, os gastos com a organização da Copa já chegam a quase R$ 4 bilhões, o dobro do previsto inicialmente.
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