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Domingo, 28 de abril de 2024

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Eles estão soltos e eu fui presa

Arlene Borja/Arquivo Pessoal

Tenho 59 anos e moro há dez em uma chácara em Atibaia e, quando no ano passado fiquei sozinha quando o meu companheiro faleceu em uma clínica de hemodiálise. Minha casa foi, então, cercada por algumas pessoas estranhas, parece que “sem-terras”.

Na rua que fica atrás da chácara, uma moça passou a dormir na carroceria de um caminhãozinho que estava no chão.

Ela ficava lá de cima olhando a minha casa o dia inteiro. Fui lá ver quem era, falar com ela e quase arrancou a chave da casa das minhas mãos. Perguntei o que estava fazendo lá, mas não respondeu. Só falou assim: “Como você é bonita!”. Vi então, num dos terrenos baldios, um encerado grande, não sei o que tinha embaixo. E à noite eu via um lampião de gás aceso neste terreno. Dava a impressão que estavam invadindo.

Em volta da chácara, tem vários lotes, que os donos nunca aparecem para cuidar. A Prefeitura, também não se preocupa com isso. Estão sem cercas e com mato alto.

Em uma tarde de outubro do ano passado, estava trabalhando no meu escritório, quando um jardineiro que não simpatizo muito, apareceu no terreno nos fundos da minha casa.

Na direção da minha janela ele colocou uma caixa de abelhas, disse ia deixar lá no terreno e que eu devia ter cuidado que eram perigosas. Comecei então, a discutir com ele, quer dizer, caí na armadilha dele. Ele pegou o celular e ameaçou chamar a polícia. Parece que era uma "armação". Foi a única maneira que ele teve para me tirar da casa, pois entrar aqui pelos muros é impossível. São muros altos com concertina em toda a volta da chácara.


Falei para ele tirar a caixa de lá, começou então a me agredir falando palavras obscenas; vi que tinha uma saliência por baixo de sua camisa e pensei que fosse um revólver. Assustada, peguei uma arma velha, que meu companheiro havia deixado, e dei um tiro para o alto para espantá-lo. Saí pelos fundos da chácara para tirar a caixa de abelhas e logo depois, ouvi a polícia chegando.

O jardineiro chamou a polícia e disse que eu queria matá-lo. Mentiu, e não teve ninguém que viu. Um vizinho ajudou-o dizendo para a polícia que “ouviu” o tiro. Fui algemada e jogada em um camburão, sem a polícia me perguntar o que estava realmente acontecendo.

Esses policiais não poderiam ter me ouvido antes de me algemarem? Ou me convidado para acompanhá-los à delegacia quando eu fui voluntariamente falar com eles? Quando viram uma velha sozinha em uma chácara, não deveriam ter investigado melhor? Acreditam que um deles chegou a exclamar em tom zombeteiro : "Nossa que muralha tem essa casa, heim?"

Sem a minha autorização entraram em casa reviraram tudo, acharam o revólver. Fui levada, e minha casa ficou toda aberta, quase foi invadida, não fosse a minha família aparecer logo. Fiquei presa por três meses e meio em Amparo e transferida para a Penitenciária Feminina de Campinas - depois de ter havido uma rebelião na cadeia de Amparo. Sem antecedentes criminais e sem ser ouvida nem pela polícia nem pelo juiz. Nestes três meses que fiquei presa, negaram-me um pedido de habeas corpus e um de liberdade provisória.

O jardineiro fez uma série de acusações absurdas contra mim. Que eu sou louca que passei pelo cano do esgoto para ir aos fundos da chácara, disse que eu solto rojões de madrugada e não deixo ninguém dormir - mentiu para o juiz. E os vizinhos que no começo estavam dispostos a me ajudar, agora estão com medo!

Infelizmente, neste loteamento tem muitas construções irregulares, em áreas de mananciais, sem fiscalização, e os imóveis desvalorizaram. Tem uma "portaria" que até permite que aconteçam coisas como esta de ter gente dorminado nas ruas. Quando eu comprei esta casa há dez anos, o loteamento era pra ser uma coisa e virou outra. Não houve progresso. Não tem infra-estrutura e está difícil vendê-la. Durante a campanha política fiz até um blog ww.atibaiareal.com.br porque muitas pessoas estão vivendo o mesmo problema aqui. Atibaia, embora receba muitas verbas estaduais, é uma cidade muito pobre, carente de tudo. O Partido Verde que ficou na administração por 12 anos, não fez quase nada.

É importante avaliar bem a administração das cidades antes de comprar uma propriedade. Ver se zelarão pelo seu investimento, ou você só vai pagar impostos sem ver o retorno.

Em 2005 invadiram um terreno que estava para ser leiloado em frente a minha casa e ligaram pra minha casa ameaçando até a minha mãe de morte, se eu chamasse a Prefeitura. Fui à delegacia fazer um B. O. de "Ameaça", denunciando o número do celular. Mas o caso nunca foi investigado. Pelo contrário, tive que ir à delegacia com um advogado, pois fui intimada a dar explicações sobre a queixa. Acabei concordando com ele e não dei prosseguimento às “investigações”.

Morei 49 anos em São Paulo, trabalhei 24 anos na USP e nunca tive problema nenhum com a polícia. Aqui, já é o segundo processo que estou respondendo - nos dois casos, houve descaso nos atendimentos por parte dela.

Em 2011 aluguei uma casa que fica dentro da chácara, com quintal separado, para um casal - que além de inquilinos trabalhariam para mim. Descobri que ele era foragido da justiça com vários processos criminais. A história, "Coloquei duas raposas para cuidarem do meu galinheiro " escrita na época, foi publicada no jornal Atibaia.com.br http://www.atibaia.com.br/noticias/noticia.asp?numero=21598

Tive o maior problema para resolver isso, pois cometi o erro de colocar o nome deles na internet quando me senti refém na própria casa. A polícia não fez nem Boletim de Ocorrência quando a chamei aqui. E esse casal ainda por cima me processou por Calúnia, Injúria e Difamação.

Eles, com essas prisões irregulares, sem provas, acabam com a vida das pessoas. Tem uma mãe que abriu a porta para a polícia, que estava cumprindo um mandato de prisão do filho, por falta de pagamento de pensão alimentícia. O filho antes de preso foi revistado e encontraram pedras de crack com ele. A mãe resolveu seguir o carro da polícia e ir à delegacia para ajudar o filho. Chegando lá foi presa também. Está na Penitenciária há quase um ano e ainda não foi ouvida pelo juiz.

O caso mais estranho que encontrei na cadeia foi o da Elizabete Benedita Umbelino, da qual fiquei amiga. Ela trabalhou 21 anos como servidora do poder judiciário, nos Fóruns de Bragança Paulista e Piracaia, quando começou a investigar algumas irregularidades na administração pública, foi presa, por meio de uma"armação“ e está sendo acusada de ser associada a uma "facção criminosa". Ela está há mais de um ano na penitenciária, sem antecedentes criminais, uma mulher decente, com dois filhos moços, casa própria, professora também. Os métodos para presos políticos mudaram. Sem DEOPS, nem DOI-CODI, fica mais fácil dos torturadores não serem descobertos.

Dá para imaginar o que é ter que ficar longe de seu trabalho, sua casa, seus animais? Até a minha cadelinha de 16 anos, morreu quando eu estava presa porque as pessoas não souberam cuidar dela. Vocês imaginam o que é ter que ficar longe da administração de suas contas bancárias, cartões de crédito. Não ter acesso a mais nada. Atrasar os pagamentos, seus negócios ficarem abandonados!

Sei que fiz uma coisa ilegal que é portar uma arma e dar um tiro. Só quis espantar o cara. Como poderia me defender sozinha em uma chácara? Essa lei do desarmamento tem que ser revista. Em certas circunstâncias as armas são necessárias, principalmente para quem vive no campo.

Esses policiais são mal remunerados e despreparados para atenderem a população, são assim por causa das condições nas quais foram colocados para exercer a profissão. Mas as vítimas deles, não entendem isso não. E continuam colocando fogo em ônibus, assassinando-os, para que as coisas mudem.

Não encontrei metade das minhas coisas quando voltei à chácara. Móveis, livros, aparelhos eletrônicos e muito mais – tudo jogado fora por minhas primas, que além disso, cancelaram minhas linhas telefônicas, as quais tinha meus contatos de trabalho. Tive que pagar para ter outras. Segundo elas, que estavam cuidando de mim, tiveram um “ataque”, ficaram perplexas ao verem a casa toda revirada, janelas abertas. Arrumaram tudo e acabaram limpando até demais. Vejam vocês e eu lá na cadeia, nem sabendo disso. Nem autorizei que encaixotassem tudo para venderem a minha casa. Eu as perdôo porque por outro lado, me ajudaram muito. Muito mesmo. Mas fiquei muito chateada de perder certas coisas que guardava há muitos anos e que também tinham valor afetivo pra mim. Mas fizeram isso porque acharam que eu não deveria morar mais aqui. Eu não penso assim. Não acho que esse jardineiro tem direito de fazer isto comigo, que consegui o que tenho com muito trabalho. Fiquei na minha casa e por enquanto estou viva. "Amém."

Por tudo isso, fiquei endividada, vendi até meu carro para pagar advogados. E, tenho certeza que o Poder Público não vai me ressarcir dos prejuízos, com seu péssimo serviço prestado à população. Marginais e menores matando tantas pessoas, crimes bárbaros estão sendo cometidos e muitos assassinos estão soltos, enquanto eu que apenas tentei me defender não fui nem ouvida e fui presa! Isso é justiça?

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