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Segunda-feira, 14 de outubro de 2024

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O PRÍNCIPIO DA CERTEZA JURÍDICA

Abuso de poder é toda conduta abusiva de utilização de recursos financeiros, públicos ou privados, ou de acesso a bens ou serviços em virtude do exercício de cargo público que tenha potencialidade para gerar desequilíbrio entre os candidatos, afetando a legitimidade e a normalidade das eleições.

Na lição de José Jairo Gomes, por abuso de poder compreende-se a realização de ações exorbitantes da normalidade, denotando mau uso de recursos detidos ou controlados pelo beneficiário ou a ele disponibilizados, sempre com vistas a exercer influência em disputa eleitoral futura ou já em curso. As eleições em que ele se instala resultam indelevelmente maculadas, gerando representação política mendaz, ilegítima, já que destoante da autentica vontade popular. ( José Jairo Gomes, Direito Eleitoral, editora Atlas, São Paulo, pág. 177).

O abuso de poder nas eleições deve ser reprimido em suas múltiplas formas, independente de sua origem ser econômica, política, social, cultural ou dos meios de comunicação.

Nesse sentido reza o art. 1º, I, d, da Lc nº. 64/90:

Art. 1º São inelegíveis:
I - para qualquer cargo:
d) os que tenham contra sua pessoa representação julgada procedente pela Justiça Eleitoral, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado, em processo de apuração de abuso do poder econômico ou político, para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes;

Apesar do dispositivo supramencionado, dar eficácia ao estampado no art. 14 § 9º da Lei maior, tal regra foi mitigada pelo art. 16 – A da lei nº. 9.504/97, in verbis:
Art. 16-A. O candidato cujo registro esteja sub judice poderá efetuar todos os atos relativos à campanha eleitoral, inclusive utilizar o horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão e ter seu nome mantido na urna eletrônica enquanto estiver sob essa condição, ficando a validade dos votos a ele atribuídos condicionada ao deferimento de seu registro por instância superior.

Parágrafo único. O cômputo, para o respectivo partido ou coligação, dos votos atribuídos ao candidato cujo registro esteja sub judice no dia da eleição fica condicionado ao deferimento do registro do candidato.

Assim, mesmo que candidato tenha sido condenado pela prática de algum tipo de abuso previsto na LC 64/90, poderá efetuar todos os atos relativos à campanha, no caso de ter recorrido da decisão a instância superior e ter declarada cautelarmente suspensa sua causa de inelegibilidade.

Como a questão é complexa, por outro norte devemos observar também o disposto no art. 11, § 10 da Lei 9.504/97:

Art. 11. Os partidos e coligações solicitarão à Justiça Eleitoral o registro de seus candidatos até as dezenove horas do dia 5 de julho do ano em que se realizarem as eleições.
(...)
§ 10. As condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade devem ser aferidas no momento da formalização do pedido de registro da candidatura, ressalvadas as alterações, fáticas ou jurídicas, supervenientes ao registro que afastem a inelegibilidade.

Assim, fazendo uma análise dos dispositivos supramencionados, temos a falsa impressão que a Legislação deixou brechas que devem ser interpretadas pelos Tribunais.

Entretanto, destaco que o princípio da certeza jurídica não foi mitigado, uma vez que o próprio legislador estabeleceu mecanismo para evitar a incerteza jurídica de uma decisão colegiada. Trata-se do art. 26-C da LC 64/90:

Art. 26-C. O órgão colegiado do tribunal ao qual couber a apreciação do recurso contra as decisões colegiadas a que se referem as alíneas d, e, h, j, l e n do inciso I do art. 1o poderá, em caráter cautelar, suspender a inelegibilidade sempre que existir plausibilidade da pretensão recursal e desde que a providência tenha sido expressamente requerida, sob pena de preclusão, por ocasião da interposição do recurso.
§ 1o Conferido efeito suspensivo, o julgamento do recurso terá prioridade sobre todos os demais, à exceção dos de mandado de segurança e de habeas corpus.
§ 2o Mantida a condenação de que derivou a inelegibilidade ou revogada a suspensão liminar mencionada no caput, serão desconstituídos o registro ou o diploma eventualmente concedidos ao recorrente.

Desta feita, é evidente que o art. 26 – C da LC 64/90, deve ser aplicado em harmonia com os artigos 11, § 10 e 16-A da Lei 9.504/97, pois, caso contrário, haverá clara ofensa ao princípio da certeza jurídica.

Entretanto, mantida a condenação de que derivou a inelegibilidade ou revogada a liminar que resgatou a elegibilidade, serão desconstituídos o registro ou diploma eventualmente concedidos ao recorrente.

Nesse sentido, existem posições defendendo que a desconstituição deve ser feita por um instrumento processual cível para tanto, seja AIRC, AIJE ou RCD (posição adotada pelo ilustre doutrinador Thales Tácito Cerqueira em sua obra Reformas Eleitorais Comentadas, pág. 740).

Entretanto, peço vênia ao ilustre professor para discordar de sua posição, por entender que a desconstituição deve ser feita de forma automática com a simples expedição de ofício contendo cópia do acórdão proferido e da ordem para desconstituição do registro ou diploma caso já tenha sido expedido.

Ainda devemos observar que, no caso da instância superior manter a condenação, ou seja, alteração jurídica que afastou a elegibilidade do recorrente, deve ser observada a regra do art. 175, § 3º do Código Eleitoral, segundo a qual são nulos, para todos os efeitos, os votos dados a candidatos inelegíveis ou não registrados. No mesmo sentido a parte final do art. 16-A da LE e também no art. 15 da Lei de inelegibilidades.

Essa posição também é consagrada pela jurisprudência:

1. Aplica-se o disposto no parágrafo 3º do art. 175 do CE, considerando-se nulos os votos para todos os efeitos, quando o candidato, na data da eleição, não tiver seu registro deferido, mesmo que a decisão de indeferimento transite em julgado somente após o pleito, como se deu no caso concreto.
2. A contagem dos votos para a legenda, conforme a regra do parágrafo 4º do art. 175 do CE, se dá quando o candidato, até a data da eleição, tiver a seu favor uma decisão, mesmo que sub judice, que lhe defira o registro e, posteriormente, essa decisão seja reformada, negando-se o registro. 3. Precedentes. 4. Agravo regimental desprovido" (Acórdão n. 6.588, Rel. Min. Gerardo Grossi, 27.2.2007).

Essas são as posições pessoais do autor, resguardada a análise mais aprofundada que só permitidas em caso concreto e inviáveis por limitações éticas e legais.

Diego Myolino Montecchi é advogado no Vale do Araguaia, Secretário Geral da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-MT e deixa claro que a tese aqui adota é posição isolada do autor e não institucional da OAB.

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