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Domingo, 28 de abril de 2024

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Mercado, planejamento e desempenho

Penso não existir dúvidas de que o mercado antecedeu aos Estados em suas diversas tipificações, que foram do estado soberano aos atuais estados democráticos; por isso, não há espaço para aquele ceticismo vulgar e irritante sobre se a galinha ou o ovo surgiu primeiro.

Este fato é tão inconteste, que o auge do mercado foi o período econômico conhecido como Mercantilismo, sistema econômico transitório que antecedeu ao Capitalismo, gerador de um grande processo de acumulação a partir de economias simples com produtores independentes trocadores de mercadorias até o aparecimento das economias complexas com produtores interdependentes intermediados pela moeda e movidos pelo lucro.

O introite está feito, porém, para prosseguirmos neste artigo há a necessidade de se indagar: o mercado resolve tudo?
Para os economistas clássicos, exceto, para o também clássico, Karl Marx, o livre mercado possibilitava o equilíbrio da economia, desde que o Estado se preocupasse e cumprisse com as suas funções clássicas e típicas, tais como: ordem e segurança internas e externas, comércio exterior, infra-estrutura, educação, saúde e justiça; no mais, o livre jogo das forças de mercado teria a função de alocar eficientemente os recursos da sociedade.

Essa autonomia dos mercados foi fortalecida pela crença de que a oferta gera sua própria procura, isto é, para ofertar bens é preciso investir, ao investir gasta-se; gasto de uns é sinônimo de renda para outros, ao gerar renda cria-se poder de compra (procura) para a oferta de produtos gerados.

Em síntese, num economês (língua dos economistas) de barranco, a correnteza era uma só: produto-renda-produto, não havia espaço para o dinheiro ir para o fundo do baú, e, mais uma vez utilizando-me do economês, inexistia qualquer preocupação exagerada com o entesouramento da renda que ficasse fora do circuito poupança-investimento-renda-produto, pois, acreditava-se que a renda poupada era igual aos gastos em investimentos.

Entretanto, com o avanço da economia monetária tudo peperecou devido a excessiva especulação na bolsa de valores, afetando toda lógica investimento-renda-produto-consumo.

Significa dizer que grande parte da renda, geradora de poder de compra, foi entesourada na ciranda de valores mobiliários, reduzindo os níveis de atividades produtivas, culminando na conhecida Quebra da Bolsa de Valores Americana e seus efeitos devastadores sobre produtos sem preços, desestímulo marginal ao investimento produtivo.
Muito bem, ou melhor, muito mal, cabe uma outra pergunta impertinente a ser feita: o mercado planeja?

Eis uma grande questão que possibilita devaneios ideológicos ineficientes, porém, fortes contra os agentes de mercado, ainda mais, em países que chegaram atrasados na linha do trem da racionalidade e do desenvolvimento, que deixaram de priorizar a lógica macroeconômica oferta-investimentos-capacidade produtiva-demanda para demanda-investimentos-capacidade produtiva-oferta.

Essa destrutiva crise de mercado requereu o intervencionismo estatal diretamente sobre a economia, quando o Estado cresceu e fortaleceu sua presença nas economias de mercado, mas, que, também, culminou numa crise intervencionista geradora de estagflação, isto é, baixo crescimento do produto(PIB) com inflação.

Portanto, antes de conclusões apressadas e juvenis, há que se ponderar a necessidade em não confundir intervencionismo com planejamento; no mínimo, há a necessidade de um intervencionismo planejado que anteceda as ações efetivamente necessárias e prioritárias.

A meu ver, como um simples economista de barranco, penso que o Estado há de ser um sentinela ativo sobre suas funções típicas e emergenciais, fortalecendo programas de aceleração de concessões e desestatização (enquanto não se pensa num plano mais duradouro e amplo), devido a incapacidade de tributar na margem, e a incapacidade de pagamento do próprio contribuinte, além de superar a vaidade em não buscar e estimular recursos externos para os investimentos produtivos e logísticos integrados.

Ao mercado cabe o planejamento a partir das expectativas racionais e adaptativas, além de ser necessário concorrer fortemente com o setor público em busca de mão-de-obra capacitada para bem remunerá-la acima da simples lógica do mercado de trabalho natural (oferta e demanda por mão-de-obra), garantindo, dessa maneira, desempenho com eficiência técnica e econômica na utilização dos recursos da sociedade.

E é só.

Ernani Lúcio Pinto de Souza, é economista do Niepe/Fe/Ufmt, mestre em Planejamento do Desenvolvimento pela Anpec/Naea/Ufpa, vice-presidente do Corecon-MT e conselheiro do Codir/Fiemt.

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