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Domingo, 28 de abril de 2024

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Limbo jurídico e o trabalhador

Atualmente vivemos em um mundo extremamente capitalista, onde a corrida desenfreada por dinheiro faz com que algumas pessoas esqueçam-se de dar atenção para sua saúde, pensando cada vez mais em trabalhar para atingir seus objetivos. Mas e quando a saúde não vai bem? Como fica o trabalhador? E a empresa como fica nessa situação?

Falando em saúde, a Justiça Trabalhista é bem rigorosa, tanto na prevenção de abuso de direito quanto na proteção do trabalhador, isso porque a saúde é a base da vida, sem ela é impossível ter uma vida digna e com qualidade.

Quando o trabalhador precisa se afastar para tratar de algum problema de saúde, a empresa é obrigada a custear os 15 primeiros dias de afastamento (§ 3º do art. 60 da Lei 8.213/91), após esse tempo o trabalhador deve ser encaminhado ao INSS para dar entrada no beneficio de auxilio doença, eis que está inapto ao trabalho, o que pode ser constatado por atestado médico.

Durante o período em que o trabalhador recebe o benefício, o contrato de trabalho fica suspenso não podendo ser alterado/rescindido. Como o benefício cessa quando constatada a aptidão para trabalho é comum ver casos em que o INSS reconhece a aptidão para desenvolver as atividades laborais determinando o retorno ao trabalho.

Ao retornar na empresa, o trabalhador será encaminhado ao médico do trabalho para constatar a aptidão para retornar ao trabalho, isso por conta da obrigatoriedade prevista na NR7 e artigo 168 CLT. Se estiver apto voltará normalmente a trabalhar e receber salário, mas e se o médico do trabalho (contratado pela empresa) entender que o trabalhador esta inapto justificando isso por um atestado médico (particular) apresentado pelo trabalhador requerendo mais tempo de recuperação?

Esta situação é conhecida como “limbo jurídico”. Eis que se cria um impasse onde quem sai mais prejudicado é o trabalhador, pois a empresa não pode receber o funcionário se o mesmo está inapto e consequentemente não pagará seu salário, por outro lado o mesmo é considerado pelo INSS como apto e não continuará a perceber seu benefício, ficando sem rendimento.

A única saída para o trabalhador é recorrer administrativamente no INSS ou procurar a Justiça Federal para conceder pagamento/prorrogação do benefício. No entanto, isso leva certo tempo e o trabalhador neste período ficaria sem salário e sem beneficio. Nesta situação como a empresa deve proceder? O que a Justiça do Trabalho vem decidindo?

Assim como o trabalhador, a empresa fica em uma situação complicada, eis que o entendimento da jurisprudência caminha para responsabilização do empregador enquanto o trabalhador aguarda a decisão do INSS bem como nos casos em que o trabalhador não consiga judicialmente ou administrativamente continuar recebendo o benefício/receber retroativo.

Nas decisões judiciais que condenam a empresa a arcar com salário do período em que o trabalhador encontrava-se no “limbo jurídico”, mencionam inicialmente como fundamento os princípios da dignidade humana e princípio da proteção, esclarecendo que o trabalhador é a parte mais fraca e não deve ter sua subsistência prejudicada, eis que o vínculo empregatício ainda é existente.

Outro fundamento usado é o que o trabalhador tenha sido prejudicado por um erro do médico da empresa, devendo assim a empresa se responsabilizar por tal prejuízo pagando os salários do período em que ficou sem salário e sem benefício, cabendo a empresa ação de regresso contra o médico ou INSS.

A fim de evitar este tipo de condenação, que costuma vir acompanhada de danos morais, a empresa deve ser cautelosa e inicialmente fornecer/arcar com exames complementares para comprovar a real situação do trabalhador, ajudar diretamente nos recursos administrativos perante o INSS e até mesmo ingressar com ação na Justiça Federal como terceiro interessado visando garantir a continuidade do benefício pelo INSS.

Durante o tempo que o processo/recurso levar para ser sentenciado/decidido, a empresa deve reunir-se com os médicos envolvidos para verificar possibilidade de o trabalhador desenvolver outra atividade dentro da empresa que não venha a complicar o atual quadro, tudo mediante laudo médico para resguardar a empresa, podendo assim continuar pagando salário, porém com a prestação de serviço.

Caso inexista essa possibilidade, cabe à empresa optar pelo bom senso e pagar o salário ou esperar ser acionada judicialmente, existindo matéria para defesa eis que na lei nada obriga a empresa a pagar tais valores. No entendo ciente do risco eis que os magistrados e desembargadores vêm entendendo que não pode o trabalhador ser prejudicado pela sua hipossuficiência e pelo conflito entre a decisão dos médicos.

Alan Franco Scorpioni é advogado da Mattiuzo & Mello Oliveira Advogados Associados

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