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Sexta-feira, 19 de abril de 2024

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Governança e gerenciamento de riscos na gestão pública


Os fundamentos da Governança Corporativa tiveram origem na década de 1930, sobretudo no âmbito dos mercados de capitais, embora a origem exata do termo tenha ganhado espaço na década de 1990.

As boas práticas de Governança começaram a permitir que os investidores retomassem o poder sobre a empresa, reduzindo, assim, a discricionariedade dos gestores, surgindo desse movimento mecanismos ou princípios que passaram a reger o processo decisório dentro da organização, traduzidos em uma gama de normativas destinadas a minimizar os problemas corporativos.

Esse modelo de gestão – notadamente empresarial – passou a ser referência para a Administração Pública.

No Brasil, a propósito, o Tribunal de Contas da União – TCU tem adotado algumas perspectivas de observação frente aos inúmeros conceitos de Governança Pública existentes.

A primeira é uma perspectiva organizacional (corporativa), que trata das condições para que cada órgão ou entidade cumpra seu papel, alinhe seus objetivos ao interesse público, gerencie riscos e entregue o valor esperado de forma íntegra, transparente e responsável.

A segunda é uma perspectiva de Políticas Públicas, que trata do desempenho dos programas e políticas públicas, levando em conta a extensa rede de interação entre estruturas e setores, incluindo diferentes esferas, poderes, níveis de governo e representantes da sociedade civil organizada.

A terceira é uma perspectiva de Centro de Governo, que trata do direcionamento que o governo é capaz de dar à nação e da sua legitimidade perante as partes interessadas, criando as condições estruturais de administração e controle do Estado.

Nesse cenário, ao contrário de qualquer ideia que paute na voluntariedade do poder público em estabelecer uma estrutura de governança e programas de Compliance no âmbito da gestão pública, tem-se, na verdade, um caráter imperativo, frente aos inúmeros riscos envolvidos no setor.

Quando se refere aos riscos envolvidos no âmbito da Administração Pública, o que se tem em perspectiva é a possibilidade de que um evento determinado afete negativamente o alcance dos objetivos da gestão, afetando, para além disso, a sua reputação.

Inconsistências no planejamento e na execução do orçamento, atecnia na prestação de contas, fraudes, corrupção, processos licitatórios irregulares, contratos sem fiscalização, falta de transparência nas informações, entre outros eventos, precisam ser considerados pela Alta Administração como possíveis riscos, capazes de inviabilizar os objetivos da gestão, e, por isso mesmo, impactar a eficiência no trato com a coisa pública, valor este cristalizado na Constituição da República.

Nessa perspectiva, os riscos precisam ser constantemente processados, compreendendo o ambiente externo e interno de cada um deles, identificando-os com exatidão para determinar o seu nível de impacto e avaliar a aceitabilidade ou não da sua ocorrência, frente às consequências que lhes são inerentes.

A depender do resultado dessa cadeia de tratamento das condutas arriscadas, a Administração Pública deve buscar medidas que mitiguem, transfiram ou evitem esses riscos, tendo como pressuposto elementar uma estrutura de Governança que dê suporte a essa empreitada.

Logo, ao que tudo indica, sobretudo a partir dos ditames do Projeto da Nova Lei de Licitações (PL n. 4.253/2020) – que exige que as contratações públicas devem ser pautadas por práticas contínuas e permanentes de gestão de riscos e de controle preventivo –, não mais estamos imersos em um mar de incertezas no quesito Governança Pública; ao contrário, este tende a ser um caminho sem volta.





Douglas de Barros Ibarra Papa é Advogado, Mestre em Direito (Largo do São Francisco – USP) e Especialista em Compliance e Integridade Corporativa (PUC-MG). Professor da UFMT. Membro da Comissão de Estudos Permanentes sobre o Compliance da OAB/MT e de Direito Penal e Processo Penal da Associação Brasileira de Advogados (ABA/MT).


 
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