Há uma semana,
no dia seguinte ao feminicídio da advogada Cristiane Castrilon, de 49 anos, o deputado estadual bolsonarista Gilberto Cattani (PL) voltou a comentar sobre um projeto de lei de sua autoria que tramita na Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT). O projeto trata sobre conceder porte de armas de fogo a mulheres com medidas protetivas decretadas pela Justiça.
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Segundo Cattani informou em entrevista à imprensa, o PL já teve parecer favorável da Comissão de Segurança da Casa de Leis. No texto do projeto, analisado pelo Olhar Direto, a justificativa diz que a medida tem como objetivo garantir a proteção da vida da mulher vítima de violência doméstica, que se socorre de medida protetiva judicial para proteção. “Trata-se de reforçar os meios de autodefesa, jamais se confundindo com o fomento a violência”, diz.
Em meio à polêmica do PL proposto pelo do parlamentar, o Olhar Direto conversou com a advogada Bárbara Lenza Lana, especialista em direito civil e processual civil, direito do trabalho e processual do trabalho, para saber de possíveis consequência e benefícios de uma mulher vítima de violência doméstica portar uma arma
Bárbara Lenza tem um escritório exclusivo que atua no direito das famílias, violência doméstica e violência política sob a perspectiva de gênero. Ela também é pesquisadora em direitos da mulher e professora universitária.
Quando informada sobre a proposta do parlamentar mato-grossense, que trata de mulheres com medidas protetivas poderem portar armas de fogo, a advogada se mostrou totalmente contrária ao projeto.
Em seu entendimento, diz, a problemática de uma arma de fogo ser entregue a uma mulher por ela estar em situação de violência doméstica, reside justamente no fato de que, por estar numa situação de violência doméstica, essa mulher já está sofrendo danos psicológicos reiterados.
“Ela não está com plenas capacidades psíquicas e também não tem preparo técnico para manusear uma arma. Uma arma de fogo é para estar com os agentes de segurança pública”, diz.
Para a advogada, a mulher portar uma arma não significa necessariamente que ela esteja segura. Nesse caso, ela chama a atenção e pontua que o efeito provocado pode ser inverso: a vítima ser assassinada com a arma que portava. “O agressor não vai avisar em qual momento irá atacar a vitima”.
“Se ela for atacada e entrar numa condição de congelamento, ela pode inclusive ser morta com a arma que ela está portando pelo próprio agressor”, explica. “Por isso, nós somos contra o armamento dessas mulheres. Nós somos contra a oferta de armas para essas mulheres”.
A advogada também destaca uma situação que pode ser desencadeada através do projeto: [o PL] tirar a responsabilidade do Estado de assegurar a segurança das mulheres e, em vez disso, colocar a responsabilidade sobre elas próprias.
“Essa tentativa de entregar armas para as vítimas para que elas se protejam, na verdade, desonera o estado do dever de proteger os seus tutelados e entrega para aquelas pessoas vulneráveis esse dever. Essa responsabilidade é da segurança pública e não da mulher que está em situação de vulnerabilidade”, diz.
Como medida, Lanza ressalta que, se existe um sistema de justiça com uma rede articulada voltada à proteção das mulheres, essa rede precisa funcionar. Uma das observações feitas pela profissional é que, atualmente, Mato Grosso não possui uma secretaria estadual dedicada exclusivamente às mulheres.
“Por isso é que nós insistimos tanto na criação da pasta da mulher pelo Estado, na construção da casa da mulher para que essa mulher tenha um aparato melhor, um atendimento melhor, por isso é que nós insistimos tanto em capacitação específica para esse tipo de enfrentamento, para que não haja justamente essa guerra institucionalizada que vai acabar se tornando cenário de violência doméstica”, diz.