Olhar Jurídico

Quinta-feira, 02 de maio de 2024

Notícias | Criminal

Mantida ação penal da Justiça comum após arquivamento de inquérito militar

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu, na sessão de hoje (25), o julgamento do Habeas Corpus (HC) 125101 em que a defesa de dois policiais militares de São Paulo pedia o trancamento da ação penal que culminou com a condenação de ambos, pelo Tribunal do Júri, à pena de dez anos de reclusão por tentativa de homicídio qualificado, ocorrido em 1992. Por maioria de votos, os ministros rejeitaram a tese da defesa no sentido de que o arquivamento do inquérito policial militar, por excludente da ilicitude, inviabilizaria a reabertura do caso na Justiça comum.

Em voto-vista apresentado ao colegiado, o ministro Dias Toffoli explicou inicialmente que, à época do arquivamento (em 1993), a competência para julgar crimes dolosos contra a vida cometidos por militares contra civis era da Justiça castrense. Porém, com o advento da Lei 9.299/1996, essa competência foi deslocada para a Justiça comum, no âmbito do Tribunal do Júri. Apesar da discussão doutrinária e jurisprudencial acerca da constitucionalidade da alteração legislativa, o ministro explicou que a norma permanece hígida e ganhou força com a Emenda Constitucional 45/2004 (Reforma do Judiciário).

Segundo voto do ministro Toffoli, que divergiu do relator, ministro Teori Zavascki – que concedia a ordem para extinguir e arquivar a ação penal –, a decisão proferida por juiz competente que determina o arquivamento de inquérito a pedido do Ministério Público Militar, quando o fato apurado está coberto por excludente de ilicitude, não impede o desarquivamento se surgirem novas provas, como prevê a Súmula 524 do STF. O ministro Toffoli salientou que a decisão da Justiça Militar não afastou o fato típico ocorrido, mas a sim a sua ilicitude, em razão do estrito cumprimento do dever legal, provado a partir dos elementos de prova existentes àquela época, segundo entendimento do Ministério Público.

“Interessante notar que o próprio Ministério Público, quando propôs o arquivamento do inquérito, o fez ‘sob as ressalvas e no aguardo de novas provas’. Isso é um indicativo robusto de que, naquele momento, o parquet militar entendeu que faltaria base para a denúncia. Nesse diapasão, o eventual surgimento de novos elementos de convicção teria o condão de impulsionar a reabertura do inquérito na Justiça comum”, afirmou o ministro Toffoli em seu voto. Ainda de acordo com o ministro, as novas provas que subsidiaram a reabertura do inquérito na Justiça comum apontam uma nova versão para os fatos ocorridos na noite de 4 de outubro de 1992, em Campinas (SP), quando os dois policiais militares atenderam a uma ocorrência de roubo em residência.

O crime

Após atenderem ao chamado, os policiais que faziam a ronda no local perceberam movimento numa favela próxima. Suspeitaram então do envolvimento de moradores de um barraco, e sem qualquer motivo que justificasse a conduta e com manifesto abuso de poder, arrombaram o local, onde dormia José Lopes de Sousa que, assustado, fugiu pelo telhado. Baleado, o homem foi levado à presença da proprietária da casa roubada, que afirmou não ter sido ele o homem que invadiu sua residência. Os policiais então simularam que levariam o baleado ao hospital, mas, no meio do caminho, em local ermo, tiraram José de Sousa da viatura, puseram-no de joelhos, com as mãos para trás, e fizeram mais um disparo contra ele, na tentativa de evitar um depoimento que os incriminasse.

Acreditando que José de Sousa já estivesse morto, os policiais então o levaram ao hospital, onde registraram o fato no boletim de ocorrências da Polícia Militar, sob o título “resistência seguida de morte”. Entretanto, o homem sobreviveu aos ferimentos, ainda que com muitas sequelas. De acordo com o ministro Dias Toffoli, está comprovada a existência de fatos diversos daqueles que motivaram o arquivamento do inquérito na Justiça Militar, em 1993. Seu voto pelo indeferimento do HC foi seguido pela ministra Cármen Lúcia e pelo ministro Gilmar Mendes, vencido o ministro Teori Zavascki, relator.


- Leia a íntegra do voto-vista do ministro Dias Toffoli.
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